Suzana Vargas (Alegrete, RS, 28.fev) Bilhete Meus olhos não expressam teu abismo Têm um brilho e não se chama afinidade Olho-te como quem vê um gafanhoto enorme a se abrigar no para-brisa do carro um homem elegante e de olhos verdes com barba ideal para noites de inverno nesse frio de cristal onde o bicho repousa Inclino-me e evito acelerar para que ele não voe e pouse suas pernas finas suas breves mãos nesse meu corpo num lugar onde o vento faça a curva
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Mostrando postagens de fevereiro, 2023
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Paulo Mendes Campos (Belo Horizonte, MG, 28.fev.1922 – Rio de Janeiro, RJ, 1º.jul.1991) Despede Teu Pudor Despede teu pudor com a camisa E deixa alada louca sem memória Uma nudez nascida para a glória Sofrer de meu olhar que te heroíza Tudo teu corpo tem, não te humaniza Uma cegueira fácil de vitória E como a perfeição não tem história São leves teus enredos como a brisa Constante vagaroso combinado Um anjo em ti se opõe à luta e luto E tombo como um sol abandonado Enquanto amor se esvai a paz se eleva Teus pés roçando nos meus pés escuto O respirar da noite que te leva.
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José Linhares Filho (Lavras da Mangabeira, 28.fev) Reencontro Fiel ao amor e à arte entre proteus, encontro a luz aquém do terremoto. A arte e o amor são em mim síntese, foto do Ser e a fotossíntese que os meus respiros pedem. No imo é que devoto o culto mais leal a encantos seus. E, na luta, assemelho-me aos Ateus: contactando o meu chão, de novo broto. Quanto mais acho, tanto mais procuro o bem de amar e criar no tempo e espaço da vigília e do sonho dos Orfeus. Reencontro-me, autêntico misturo Poesia e Amada num grandioso abraço, imagens do infinito amor de Deus!
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Geir Campos (São José do Calçado, ES, 28.fev.1924 – Niterói, RJ, 8.mai.1999) Inventário Esta epiderme há muitos muitos anos me cobre: guarda algumas cicatrizes, outras não lembra mais, e até mistura uns caminhos da infância a outros de agora. As unhas não direi que são as mesmas com que o seio nutriz terei vincado: são mais duras, mais feias e mais sujas – pois nem sempre de amor e entrega foi o chão em que plantei, colhi nem sempre. Se os dentes não gastei, gastei meus olhos entrevendo paisagens, vendo coisas, cegando-me ante sésamos de sombra. A alma apanhou demais e vai pejada, mas vão leves as mãos cheias de nada
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Carmen Moreno (Rio de Janeiro, RJ, 28.fev) Ensaio sobre as manhãs A porta do fim dá num beco inusitado, repleto de recomeços. Ninguém descobre o frescor do chão desabitado, enquanto o medo jura seus infernos! Mas se a vida chama e o sujeito mete a cara, não há terror que o aterre em jardim morto. Movem-se as horas de infinito e novidades, que não cabem nas compotas das certezas. O vento descabela de improviso as folhas, forrando de beleza o caminhar, (e há dor na rebentação dos ramos). Os dias são bichos indomados, sem nome e classificação: ninguém se socorre do sofrer por adivinhação, nem pondo tranca nos abraços. A vida entra em qualquer gruta, e cata o ente debaixo de pedra, quando cisma de ensinar pelo padecer. Também o sol invade o olho agoniado, devolve o infeliz ao sonho, e transforma em liquidez seu sangue coagulado. O certo é que nunca se sabe o que a manhã assina: e a sorte é o não sab...
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Juliana Toinoven (Mogi das Cruzes, SP, 27.fev) a poesia da mulher louca quando não imaculada santificada distante de virgem maria mulher é tentação perdição de comportamento desviante animalesca precisa ser domada quando violentada ela estava pedindo ventre corrompido simulacro de eva não tocar e não interromper castigue, mesmo que ainda criança todo tempo é idade das trevas quando se é mulher
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Pedro Rubens de Freitas Wayne (Salvador, BA, 26.fev.1904 – Bagé, RS, 13.out.1951) Mensagem pro Mário de Andrade Mário de Andrade você pra essa gente de agora mande sua maneira de cantar a poesia. É verdade que o Carlos Drummond de Andrade permanece aqui salvando o que tem ela a dizer. O Murilo Mendes também não desertou e mantém a poesia em posição. Manuel Bandeira e Schmidt continuam a poesia. Mas não falo de vocês que na desabusada arruaça do ano de vinte e dois arrancaram estranho mundo pro pendão da poesia. Manda Mário de Andrade pra essa gente de agora um pouco desse teu jeito de estampar a poesia. É que se outros moços vieram o ano de vinte e dois nunca mais teve ninguém.
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Fernando Naporano (São Paulo, SP , 26.fev) O silêncio do ar parece rachar o abandono dos meus sentimentos A cabeça conclusivamente vazia ilha de fel feliz resignada sem soluções sem as cercas dos dias O olhar ao nível da terra plenitude roxa a arder de esquecimento Nada ao lado de nada é a pedra a rigidez da sua lava que afasta quem contempla o rosto
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Alexandre Bonafim (Belo Horizonte, MG, 26.fev) Nudez Uma nudez capaz de clarificar os objetos adensando-os em pura fantasia concretude selvagem intensa presença Uma nudez de ângulos precisos perfeita como prisma peixe esguio talhado em pedra em sêmen Um corpo de contornos em êxtase jorro pleno do real geometria em vertiginosa febre Uma nudez irmã gêmea da sede mãe de todo o existente pupila do fogo espelho estilhaçado pela luz das flores Um corpo despido até a ausência capaz de purificar o pensamento concentrando-o em maciça precisão correnteza fixa cortante delírio x
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Tanussi Cardoso (Rio de Janeiro, RJ, 25.fev) Ainda há tempo Fica a ideia da poesia e da morte: a pedra no caminho o feijão cabralino a aurora da minha vida. Fica a impressão de que tudo passou como um empurrão num precipício: abismo sobre abismo. Alguns amigos alguns amores e a sensação angustiante de que sobraram palavras e faltaram palavrões. À altura dos cabelos brancos uma lição: é preciso chutar o balde! Sempre há tempo para a desarrumação.
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Anisio Garcez Homem (Florianópolis, SC, 25.fev) Com natureza morta é necessário assombrar-me com a pestilência das conversas deste momento da sinfonia amarga de uma mãe que espera a hora sombria do filho na guerra nada é tão abismal quanto o tornozelo inchado de correr nestes tempos por entre artefatos que maltratam a carne sobre a mesa as frutas esmagam o tempo nas farpas de seu odor em volta dela homens mascam a cartilagem de horas trágicas
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Alberto Pucheu (Rio de Janeiro, RJ, 25.jan) Poema para carregar no bolso Entreguei o corpo aos abalos da cidade. Mastigo seus vergalhões, o sabor perdido do torrão ancestral. Independe de mim a oscilação da Bolsa, a noite de carros, as palavras derivadas em poemas, o exagero luminoso por todos os bairros, o abalroamento na esquina e na estrada. Estou à margem do resultado de todas as coisas. Violino desacompanhado, não tenho para a vida uma pauta de Bach. Inventar-me-ei nessas linhas. Ou não cumprirei arrojos necessários. Sigo, com o nome de meu avô antes de seu avô nascer, com a mesma sensação ubíqua do momento em que fui concebido, com pensamentos de quelônio submerso em mares distantes... Os pés descalços, a sola engrossada por caminhos andarilhos, o dorso aderindo ao jeito do asfalto e das calçadas, o corpo manuseado pela rebelião sísmica e descontínua da cidade.
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Carlos Emílio Corrêa Lima (Fortaleza, CE, 24.fev 1956 – Fortaleza, CE, 2.abr.2022) Um lago de acidez Todos os cigarros de uma vez Apagados Estradas que apagam aedos Move-se máquina na inocência dos bambus. Vamos curtir o couro do silêncio? Qual a melhor posição para a mesa de pensar? Escrever pro Oeste, pro Norte? Com a cara pro Sul ou para o Leste? – leia outros poetas em leiturasnamadrugada.blogspot.com
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Franklin Mello (Rio de Janeiro, RJ, 22.fev) agora enquanto as negras nuvens se aproximam, a voz não cala é preciso ter certeza é preciso ter um rasgo imenso no peito, expor sem valentia o coração pulsante – não me negue um gesto de simpatia ou, se preferir o escárnio, que seja vou continuar carregando este pesar, porque apesar do tempo ruim, e enquanto houver chão chegarei no momento do sol nascer a ouvir o rebuliço dos passarinhos a sentir a vida que há sob a relva vermes formigas lesmas meus pés descalços, a cócega na planta me dá vontade de arregaçar a calça atirar fora a camisa e me jogar na terra, me espojar feito menino por isso vivo e ninguém há de me matar