A poeta JÚLIA
CORTINES (Maria Júlia Cortines Laxe) nasceu em
Rio Bonito (RJ), em 12 de dezembro de 1863 (alguns autores indicam 1868).
Começou a escrever cedo – aos 21 já colaborava com o jornal O País e as revistas A Semana e A Mensageira –, mas deixou apenas dois livros: o primeiro aos 31
anos, Versos (1894), o segundo, aos
42, Vibrações (1905).
A maior parte de sua
produção foi feita para jornais ou simplesmente ignorada – muitos críticos
atribuem ao estilo, o parnasianismo, e à condição da mulher no período em que
viveu, as razões para que isso tenha ocorrido.
Em 2010 a Academia
Brasileira de Letras republicou Versos
– Vibrações de Júlia Cortines, na
Coleção Austregésilo de Athayde (que pode ser acessado https://www.academia.org.br/abl/media/CAA-032-Poesias%20Reunidas-Julia%20Cortines-MIOLO-PARA%20INTERNET.pdf).
Seus poemas também podem ser encontrados nos livros Roteiro da poesia brasileira – Parnasianismo (2007) e A poesia fluminense no século XX: antologia
(1998).
Foi professora e faleceu no Rio de Janeiro (então Capital Federal), no dia 19 de março de 1948, aos 85 anos.
* * *
ANCIÃO AFRICANO
A testa negra sob a carapinha
branca.
Da longa escravidão a tremenda
tortura
Não lhe alterou da face a
expressão de doçura.
Um riso bom entreabre a sua boca
franca.
A vingança do peito um brado não
lhe arranca;
Em seu tranquilo olhar o rancor
não fulgura,
Quando, na resignada e humílima
postura,
Vê se erguer uma mão que ameaça e
que espanca.
Verga-lhe agora o corpo um secular
cansaço;
E através desse olhar que não
pensa, mas sonha,
Desse olhar a que basta um
pequenino espaço,
Vê-se uma alma de paz, uma alma de
bonança,
Doce, meiga, infantil, amorosa e
risonha,
Como uma alma feliz e ingênua de
criança.
* * *
NOSTALGIA SELVAGEM
Longe, longe, a uma grande,
infinita distância,
Que não me será dado afrontar
nunca mais,
Fica a terra onde vi deslizar
minha infância:
Tal, sob um bosque em flor e um ar
todo fragrância,
Um arroio a correr através dos
juncais.
Vejo ainda essa pátria adorada e
formosa:
– Densa e verde, a floresta
infinda se estender
Por sob um céu azul, broslado de
oiro e rosa,
E a cachoeira, como uma serpe
raivosa,
Pelos flancos da serra, em
convulsões, descer...
Pátria onde vive e luta uma raça
valente,
Que a morte encara sem os olhos
abaixar,
Que sabe opor o peito à força da
corrente,
Vencer o tigre, a flecha atirar
destramente,
E na mão do inimigo o tacape
quebrar.
Vejo agora, – ó visão de sonhos
tentadores! –
Da fronte a cabeleira a
escorregar-lhe aos pés,
Tendo na brônzea pele o perfume
das flores,
Ágil, esvelta e linda, a virgem
dos amores,
Seminua, passar das ramas
através...
Asas! Ave que vais para longe, eu
quisera
Asas para transpor, como tu, a
amplidão!
De um país onde fulge, eterna, a
primavera,
Longe o amor me sorri e a luta
chama e espera.
Asas! para fazer voar meu coração!
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