O poeta CARLOS
CARDOSO nasceu no Rio de Janeiro (RJ) no dia 30 de dezembro de 1973. Formado
em Engenharia, é autor de Melancolia
(2019) e Na pureza do sacrilégio
(2017). Os dois foram publicados depois de um intervalo de mais de dez anos,
quando ele publicou Dedos finos e mãos transparentes, em 2005, antecedido
por Sol Descalço em 2004.
Na
pureza... (indicado ao prêmio Bravo! de Cultura de Melhor Livro em
2018) foi traduzido para o búlgaro pelo poeta Rumen Stoyanov, bem como outros
poemas foram traduzidos e publicados em revistas da América e da Europa. Melancolia foi premiado pela Associação
Paulista de Críticos de Arte (APCA) como o Melhor Livro de Poesia do ano
(2019).
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NOITE SEM MAR
Sinto sua falta
e não dos seus riscos
em demasia,
os pingos nos is
você nunca os coloca,
parafina usada
para salvar o dia em flor,
a noite sem mar.
Ontem,
ainda no cedo da noite
quis tocar o seu rosto,
vi – a luz do sol brilhar
no céu do seu rosto,
vi – a única esperança
do que é
e talvez será
em um poema rasteiro,
simples
como um mergulho
no ar,
a despedida.
* *
*
O ROLAR DA PEDRA
A pedra que percorre
o Rio de
Janeiro
iniciou seu
percurso
na fonte,
pedra na banda
podre que
se espalha
na
escuridão com tiros,
bombardeios,
sacrifícios,
crianças
armadas de neblina,
tiro no
escuro, furo,
que do alto
do morro
ninguém
acerta,
ninguém vê
ou alerta.
A pedra
rola pela escadaria,
as
trincheiras estão por ali,
o calabouço
já não é refúgio
e ser preso
faz parte do cenário.
Pedra que
vira manchete
da revista,
pedra que está
no pó, no
centro do morro,
pedra sem
horizonte.
Pedra de
coca, pedra de crack,
pedra na
pedra.
É dura essa
vida tão curta,
criança que
já nasce armada,
pedra que
corre e se esconde
vai de um
morro a outro
como se
voar fosse nada.
Pedra no
dentro da madrugada?
Madrugada
no dentro da pedra?
Pedra que
brincar desconhece,
pedra em
escola não vai,
pedra
aviãozinho, pedra no asfalto,
pedra na
Maré, pedra na Rocinha,
pedra no
Leblon, Pavãozinho?
Rola essa
pedra na margem,
já que a tangente
é nada,
essa viagem
é curta, abrupta,
pedra na
jaula jogada.
Pedra.
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