Em vida, ele publicou
apenas alguns poemas, artigos e um discurso comemorativo. Falecido no Rio de
Janeiro em 25 de abril de 1852, o paulista ÁLVARES
DE AZEVEDO tornou-se figura representativa nos estudos literários
brasileiros no período que ficou conhecido com o ultra-romantismo. Nascido em
12 de setembro de 1831, em São Paulo, Manuel Antônio Álvares de Azevedo Filho integrou
a geração de poetas românticos que se sentia uma “geração perdida” – ao lado de
Casimiro de Abreu (1839-1860), bem mais comportado e autor do conhecido “Meus
oito anos”, e Fagundes Varela (1841-1875), nem tanto assim, autor de “Cântico
do Calvário”.
Como tantos outros
jovens da época, Azevedo dava vazão a sua inadequação à realidade e o pessimismo
em uma vida desregrada – filho de família rica, recebeu instrução jurídica e
viveu entre os estudos acadêmicos, o ócio, os casos amorosos e a leituras de Lord
Byron (1788-1824) e Alfred de Musset (1810-1857), cujo estilo de vida procurava
imitar – um na entrega ao spleen,
outro na artificialidade do “mal do século”. E, como tantos poetas românticos,
morreu tuberculoso, aos 20 anos, depois de complicações resultantes de um
acidente enquanto andava a cavalo. Pelo modo de viver e pela idade em que
morreu, antecipou o slogan “sexo,
drogas e rock’n’roll”. Segundo o poeta modernista Mário de Andrade, “Secreta ou
confessadamente o homem romântico se inclinava a morrer moço” (1974, p. 199).
Sua produção –
poesia, prosa e teatro – foi desenvolvida em apenas quatro anos, enquanto ele era
estudante universitário. “Esse monte de prosa e verso é tão irregular porque
não foi devidamente polido, ou porque o Autor queria que fosse assim mesmo,
para sugerir a inspiração desamarrada, em obediência a uma estética atraída
pelo espontâneo e o fragmentário?” pergunta o crítico Antonio Candido em A educação pela noite e outros ensaios
(1989, p. 11), para quem o ultra-romantismo criou “novos sulcos de rotina”
(1997, p. 183).
A obra poética mais conhecida
de Azevedo é Lira dos Vinte Anos.
Nela, o poeta declara sua frustração amorosa e um pessimismo, principalmente
nas partes I e III, onde lemos um Álvares de Azevedo adolescente, sentimental,
ingênuo – a “face de Ariel”. Na parte II, encontramos a “outra face” de
Azevedo, a de Caliban, anunciada no segundo prefácio da obra: “Cuidado, leitor,
ao voltar esta página! Aqui dissipa-se o mundo visionário e platônico. Vamos
entrar num mundo novo, terra fantástica, verdadeira ilha Baratária de D.
Quixote, onde Sancho é rei e vivem Panúrgio, sir John Falstaff, Bardolph,
Fígaro e o Sgnarello de D. João Tenório – a pátria dos sonhos de Cervantes e
Shakespeare. [...] A razão é simples. É que a unidade deste livro funda-se numa
binômia. Duas almas que moram nas cavernas de um cérebro pouco mais ou menos de
poeta escreveram este livro, verdadeira medalha de duas faces. [...] Agora
basta. Ficará tão adiantado agora, meu leitor, como se não lesses essas
páginas, destinadas a não ser lidas. Deus me perdoe! Assim é tudo! Até os
prefácios!”
A melancolia em Álvares de Azevedo, antes de
ser “serena e profunda”, demonstra níveis de “tortura e drama desenfreado”
(CANDIDO, 1997, p. 271). Esse universo também foi desvendado por Azevedo nos
contos de Noite na Taverna e na peça
teatral Macário – retratam um mundo
decadente, onde habitam viciados, prostitutas, bêbados solitários e homens sem
destino. “Também nessa literatura” – acrescida de versos de O conde Lopo e do Poema do Frade – “que herdou de Blake e de Byron a fusão de libido
e instinto de morte, Álvares de Azevedo caminhava na esteira de um Romantismo
em progresso enquanto trazia à luz da contemplação poética os domínios obscuros
do inconsciente”, escreve Bosi (2000, p. 113). Como morreu ainda jovem, a
identificação com o byronismo marcou a sua poesia. O poeta inglês ficou famoso,
também, por sua excentricidade e pelos longos poemas narrativos, como “Don
Juan”, concluída em 1823 e considerada sua melhor obra. Entre os estudantes era
comum idealizar a vida boêmia, o que os levava a pensar que realmente a viviam.
Assim como o herói baronyano – de linhagem nobre, orgulhoso, indomável, com um
passado maligno – Álvares de Azevedo nos faz pensar se ele viveu as paixões que
descreve, se há, em seus poemas, algo além de desejos por uma mulher virgem,
assexuada e incorpórea. Na lápide de sua sepultura, uma estrofe do poema
“Lembrança de morrer”: “Descansem o meu leito solitário/ Na floresta dos homens
esquecida, / “À sombra de uma cruz, e escrevam nela:/ – Foi poeta – sonhou – e
amou na vida”; o que só confirma a intensidade com que viveu.
(A partir de ANDRADE, 1974; AZEVEDO, 1999,
2001; BOSI, 2000; CANDIDO, 1989, 1997; CEREJA, MAGALHÃES, 2000; http://www.academia.org.br/academicos/alvares-de-azevedo/biografia)
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