Num primeiro momento, ele foi considerado
representante da Geração de 45, para, em seguida, ser visto como um poeta que “cortou”
qualquer tipo de vínculo ético-político ou estético – “no sentido moderno de
construtivo de um objeto artístico” (BOSI, 2000, p. 488). Trata-se de MANOEL DE BARROS, nascido em 19 de
dezembro de 1916 em Campo Grande, cidade do interior do Mato Grosso do Sul
(MS).
Manoel Wenceslau Leite de Barros estreou
em 1937, com Poemas concebidos sem
pecados, antes de se mudar para o Rio de Janeiro, onde se tornou bacharel
em Direito em 1941. No livro, é clara a
relação com o Modernismo de 22 e a “presença” de Mário de Andrade; o Rio de
Janeiro continua presente em A face
imóvel (1942). Depois deles, viaja para Nova York, Roma, Paris, Lisboa, Bolívia
e Peru (1943-1945). Poesias, de 1956,
pode ser considerado um divisor de águas – ele recua para um lirismo mais convencional.
É em Compêndio para
uso dos pássaros (1961) que o poeta consolida seu estilo e o pantanal, sua
flora e fauna, se tornariam o cenário preferido do poeta, que provocaria, mais tarde,
o filólogo Antonio Houaiss a compará-lo a São Francisco de Assis, “na sua humildade
diante das coisas”1. Em tudo, Manoel de Barros “Alude à sacralidade
natural desse estado primordial, do qual a natureza participa [...] e os seres
que a ele conseguem voltar, como o poeta”, assinala Ligia Savio. Sobre o livro
e sobre a liberdade do uso da língua, avesso à lógica, disse o experimentalista
poeta de Mato Grosso: “Penso que só com a desarrumação sintática se consegue
atingir o criançamento do idioma.”
O
experimentalismo se torna mais intenso em Gramática Expositiva do Chão (1969), com
o uso intenso de enumerações, movimento entre os registros narrativo e
descritivo, poemas como notas de rodapé e diálogos entre o poeta e seres
animizados. Outra forte característica de Manoel de Barros é o interesse pelas “coisas
inúteis”, que dará o título ao livro de 1974, Matéria de Poesia. Este interesse, além da poesia, demonstra uma
preocupação social do autor, de resistência diante da realidade, em comunhão com
a natureza, que o público irá reconhecer, enfaticamente, com O livro das Ignorãças (1993) e Livro sobre Nada (1996).
Um de seus temas preferidos é a
infância, recurso para
criar imagens ou personagens, ponto de vista e matriz da linguagem poética,
passagem da vida a qual dedicaria o livro Exercícios
de ser criança (1999), mas que é perceptível em toda a obra de Manoel de
Barros, composta de mais de 30 livros, alguns com edições na Alemanha, em
Portugal, na Espanha (também em catalão) e na França. Entre 2005 e 2007, foram
publicadas as Memórias Inventadas,
volumes I, II e III e, em 2010, a antologia Poesia
Completa.
O reconhecimento de sua poesia, de
linguagem simples e insólita, se deu entre as décadas de 1980 e 1990, tendo merecido
o Prêmio da Crítica/Literatura da Associação Paulista de Críticos de Arte
(APCA), o primeiro Jabuti (O guardador de
águas, 1989) e o Prêmio Nacional de Literatura do Ministério da Cultura,
pelo conjunto da obra (1998). Ganhou outros, antes, durante e depois, inclusive
um segundo Jabuti, por O fazedor de
amanhecer (2002), um segundo APCA (2005) e o Nestlé de Literatura
Brasileira (2006), ambos por Poemas
Rupestres.
Sem se
afastar do que se chama “vanguardismo primitivo”, Manoel de Barros, que tem “um
ermo enorme dentro do olho” (2010, p. 187), que “tinha o roteiro do luar com o
mapa da mina” (2002, p. 21), que teve um avô como “provedor de poesia como as
aves e os lírios do campo” (2000, p. 51) e que “queria crescer pra
passarinho...” (1996, p. 30), é O
poeta das insignificâncias; conquista leitores com seus versos e promove o necessário
reencantamento do mundo. “Com pedaços de mim eu monto um ser atônito” (1996, p.
37).
Em 24
de outubro de 2014 o escritor foi internado num hospital de Campo Grande para
uma cirurgia de desobstrução do intestino. No dia 13 de novembro, às 8h05 sua
morte foi decretada, por falência de múltiplos órgãos. No carnaval de 2016 e
2017, foi homenageado pelas escolas de samba Sossego e Império Serrano – ambas sagraram-se
campeãs...
(A partir de BARROS, 1996,
2000, 2002, 2010; BOSI, 2000; SAVIO in https://scielo.conicyt.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0716-58112004001500005;
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