O porto-alegrense RAFAEL IOTTI nasceu em 24 de dezembro de 1992. Aos 25 anos, publicou o primeiro livro, Mas é possível que haja outros; em 2019, veio o segundo, Assim guardamos as nuvens. Em ambos, um mundo de melancolia e contemplação do efêmero em que há espaço, também, para a alegria e questões que ele interpreta como “imaturas”. “Há um autor polonês, Witold Gombrowicz, que diz que a imaturidade é a forma mais sincera da pessoa”, referiu-se em uma entrevista por ocasião da sessão de autógrafos do segundo livro.
Sobre o primeiro livro, dividido em três partes – “Poemas indecisos ou cinco poemas infantis”, “Poemas frágeis” e “Poemas insensíveis” –, André Tessaro Pelinser e Letícia Malloy, comentam sobre o modo de fazer poesia de Rafael, encontrando traços com o modernismo. “O prosaico, o simples, o dia a dia das ruas e da cidade são incorporados ao fazer poético e instituem uma atmosfera em que o cotidiano confere identidade ao texto”, escrevem no artigo “Irrupções poéticas no cotidiano: entrevista com Rafael Iotti” (2018, p. 13).
Em relação a isto, o autor afirmou, na mesma entrevista: “A poesia, diferente da prosa, é um estado de êxtase. [...] a poesia me vem, quase como um fantasma, algo etéreo, e a minha única função é transformar aquilo em linguagem. Sendo assim, não tenho opções. Nem estéticas, temáticas, éticas etc. É claro que esse espírito, que talvez nem seja meu, é guiado pelas minhas sensações mundanas: o que eu vi, o que eu li, o que eu senti etc. Mas isso, para mim, a feitura, o guiamento que se dá, é completamente inconsciente” (2018, p. 14-15).
Leitor de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Charles Bukowski (1920-1994), Nicanor Parra (1914-2018), Robero Bolaño (1953-2003), Arthur Rimabud (1854-1891) e Cesare Pavese (1908-1950), entre outros tantos, busca ser verdadeiro consigo mesmo a partir da escrita. "É pelo amor pelas coisas, Do cheiro do fogão à lenha, de ver a nuvem passando no céu. É ver as coisas bonitas, mas sempre com essa coisa melancólica, de se comover porque tudo isso vai acabar. Acho que é por isso que eu fumo. Pra estar fazendo alguma coisa enquanto as pessoas me veem olhando para o céu" (jornal Pioneiro, 22.3.2019).
Assim como no primeiro livro, na segunda publicação de Rafael, Assim guardamos as nuvens (2019), o leitor encontra situações em que o poeta lida com a matéria a partir do que Vargas Llosa "definiu como um questionamento radical do mundo em que vivemos", como antecipam Pelinser e João Claudio Arendt na resenha de Mas é possível que haja outros, publicada na revista Afluente (2018, p. 254). O que a escritora Veronica Stigger os ajuda a entender melhor na "orelha" de Assim guardamos as nuvens: "[...] todos os poemas do livro são de amor - e de morte, que talvez seja a mesma coisa. Viver poeticamente é viver na iminência deste encontro, que pode se dar à sombra da melancolia, mas com os olhos postos numa alegria transformadora".
Os primeiros poemas foram publicados na rede social e, mesmo transpostos para os livros, apenas fortalecem a necessidade escrever, afirma o poeta. "Eu percebi que precisa disso, da literatura, que não era uma coisa passageira, e sim vital, no final da minha adolescência. Ali eu tive a certeza de que viveria e morreria disso" (2018, p. 14). E, enquanto novos poemas não vêm a público, paira a ideia, revelada em entrevista, de um romance, sobre mudanças físicas e espaciais, sobre a vida na "cidade grande" e sobre as origens. Porque existe a vontade de tudo nomear e, como anotou o poeta Marco de Menezes, em Mas é possível que haja outros, "algo fica, ou some, que nos escapa, o que está para além de qualquer nome".

(A partir de ANDRADE, 22.3.2019; ARENDT, PELINSER, jan-abr, 2018; MENEZES in IOTTI, 2017; PELINSER, MALLOY, 2018, n. 1; STIGGER in IOTTI, 2019).


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