Foto: Arquivo Geremia


O poeta caxiense CYRO DE LAVRA PINTO nasceu em 8 de fevereiro de 1900, filho e irmão de escritores e jornalistas.
Foi um dos fundadores e o primeiro presidente da Academia Caxiense de Letras (ACL, 1º de junho de 1962), integrou o Ateneu Literário de Caxias do Sul (fundado em 1926, por Alfredo de Melo Tinoco) e colaborou com diversos jornais e revistas, de Caxias e Porto Alegre.
Publicou os livros de poemas Dados e Petardos (1950), Envelhecendo (1950), Átomos Poéticos (1951)  que mereceu resenha de Paranhos Antunes na capa no jornal O Momento, de 24 de fevereiro daquele ano , Mulheres (1951) e Homens Notáveis (1951); e um de crônicas, Fatos e Fantasias (1952); segundo dados do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami, Cyro escreveu mais de dois mil sonetos – alguns reunidos em cinco livros inéditos.
Foi membro correspondente da Academia Rio-Grandense de Letras, e, em 23 de maio de 1951 recebeu o título de acadêmico honoris causa da Academia Estudantil de Letras, fundada por alunos da Escola Normal Duque de Caxias, de Caxias do Sul, conforme o jornal A Época (p. 6).
Faleceu em 28 de agosto de 1980.


O Relógio

Rodando em seu tic-tac isócrono e tedioso,
que marca o instante amargo e o instante da alegria,
o relógio é, por certo, um servo que nos guia,
sem ter, nem mesmo à noite, uma hora de repouso.

Trabalha sem cessar, trabalha noite e dia,
podendo assim servir de exemplo ao preguiçoso,
ao ser que vive no ócio, ao ser indecoroso,
ao ser abjeto, ao ser inepto e sem valia.

Seu pêndulo – expressão de amor e sentimento –,
move-se como um sino e fala ao pensamento,
como se fosse a voz do Tempo e da Verdade.

Parece o coração, no côncavo do peito!
pulsando, às vezes triste, às vezes satisfeito,
para cessar, por fim, no umbral da eternidade.

* * * * *

O Pensamento

Nas asas da emoção palpita o Pensamento,
como que eletrizada em frêmitos vibrantes,
atingindo, veloz, os mundos mais distantes,
os mundos siderais do etéreo encantamento.

Não quer ficar aqui, neste áspero tormento,
aqui, neste desvão de mágoas torturantes,
onde o cérebro, hostil, com vínculos possantes,
procura escravizá-lo ao ríspido elemento.

Não! ele quer o espaço e quer a liberdade,
quer voar pela amplidão, igual à divindade,
quer abranger os céus, num surto aventuroso.

E ei-lo, por isso, ali, radiante de alegria...
– alma, a esfazer-se em luz nos edens da harmonia,
– condor, a voar além, no espaço esplendoroso!

* * * * *

Caveira

Curioso como Hamlet, em tênebras oculto,
a investigar do além o fúnebre mistério,
encerro-me no horror deste atro eremitério,
e a ti, Caveira, ansioso e impávido, consulto.

Fala-me, pois, Caveira! alude ao orbe etéreo,
fala-me do Senhor, do eterno e excelso vulto,
da inalterável paz da vida sem tumulto,
da inescrutável luz do imenso e ideal império.

Dize-me, por favor, o que há depois da morte,
para onde vai nossa alma, após o rude corte,
após baquear o corpo, inerte e sem alento.

E dize-me, afinal, em que édens vive agora
o espírito que ardeu no crânio teu outrora,
e que era a Vida, a Luz, a Ideia, o Pensamento...

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