O padre ANTÔNIO VIEIRA ficou conhecido não só pelo dom da oratória e por ser um homem de ação, mas também por ser um visionário.
Nascido em Lisboa, no
dia 6 de fevereiro de 1608, antecipou, nos “Sermões do Rosário”, o nosso tempo:
“O primeiro naufrágio é o do governo, o segundo e último o da república”.
Vieira produziu mais de duzentos sermões e quinhentas cartas, com destaque para
o “Sermão da Sexagésima” (1653) e o “Sermão de Santo Antônio (aos peixes)”, em
que ataca a escravidão e proferido no Maranhão em 1654. Sua obra, hoje, é
reconhecida tanto como literatura portuguesa quanto brasileira.
Na narrativa bivocal de
Boca do Inferno, em que biografa o
poeta Gregório de Matos (1636-1696), contemporâneo de Vieira, Ana Miranda,
destaca: “Aquilo que Vieira fazia pelos judeus não era do sangue, mas do
pensamento. Abandonado pelos poderosos, o jesuíta começou a sofrer todo tipo de
perseguição. As acusações contra ele foram inúmeras [...] que ele costumava
dizer heresias, que acreditava na sobrenaturalidade, que acusava o papa de
errar na canonização dos santos, que entrava em Portugal com livros proibidos,
que se havia casado com uma hebraica em Amsterdã, que tratava Deus como se ele
fosse um simples homem, ciumento, invejoso, irado. Nada disso ficou provado,
mas Vieira foi jogado numa prisão por ter feito profecias” (2013, p. 174).
Sem enxergar e quase
surdo, o padre morreu em 18 de julho 1697, em sua cela no Colégio da Bahia, na
primeira hora da manhã do dia 18 de julho de 1697.
“Muitos não entendem
o que leem, e ler sem entender, é como se não leram.” (“Sermão Vigésimo
Segundo”)
“A paz que não elegem, mas aceitam os vencidos, ou desesperados,
não é de mel, mas de fel: não é doce, mas cheia de amarguras, como as que
padecem do jugo do inimigo os que por não poder resistir, nem fugir, remiram
com a liberdade as vidas; servidão enfim, e cativeiro, e de nenhum modo paz.”
(“Sermão Décimo Segundo”)
“Para um homem se ver
a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e
é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de
noite, não se pode ver por falta de luz. Logo há mister luz, há mister espelhos
e há mister olhos. Que coisa é a conversão de uma alma senão entrar um homem
dentro de si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, é
necessária a luz e é necessário o espelho. O pregador concorre com o espelho,
que é a doutrina; Deus concorre com a luz; que é a graça; o homem concorre com
os olhos; que é o conhecimento.” (“Sermão da Sexagésima”)
“A primeira coisa que me desedifica, peixes, de vós, é
que vos comeis uns aos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o
faz ainda maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem
os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os
grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os
pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande. Olhai como
estranha isto Santo Agostinho: Homines
pravis, praeversisque cupiditatibus facti sunt, sicut pisces invicem se
devorantes: ‘Os homens com suas más e perversas cobiças, vêm a ser como os
peixes, que se comem uns aos outros.” Tão alheia coisa é, não só da razão, mas
da mesma natureza, que sendo todos criados no mesmo elemento, todos cidadãos da
mesma pátria, e todos finalmente irmãos, vivais de vos comer! Santo Agostinho,
que pregava aos homens, para encarecer a fealdade deste escândalo, mostrou-lhe
nos peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável
é, quero que o vejais nos homens. [...]” (“Sermão do Santo Agostinho aos
peixes”)
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