Escritor de quadrinhos, o argentino HÉCTOR GERMÁN OESTERHELD nasceu em 23 de julho 1919, filho de pai judeu alemão e mãe basca. Desde as primeiras histórias que escreveu – situadas na década de 1950 e princípio dos anos 60 – já imprimia uma forte crítica ao capitalismo, ao colonialismo e ao imperialismo. De sua autoria, as séries mais conhecidas são Sargento Kirk (alter-ego do desenhista italiano Hugo Pratt), Bull Rocket (desenhado por Paul Campani) e O Eternauta (sua obra-prima), publicadas em revistas como Hora Cero, que editou com o irmão, Jorge, e com a qual “deu o tom da alta qualidade de textos de HQs argentinos”, segundo Carlos Patati e Flávio Braga (2006, p. 125), e Frontera Mensal, também idealizada por ele.
Oesterheld – cujo nome depois se tornaria nome de prêmio internacional na Itália – também criou o boxeador Índio Suarez (desenhado por Carlos Freixas), Sherlock Time (em parceria com Alberto Breccia) e os faroestes Randall, Verdugo Ranch, Hueso Clavado, Leonero Brent, Tom de La Pradera, Doc Carson, Watami e Loco Sexton. No entender de Patati e Braga, “Oesterheld foi um dos autores que deu rumo e densidade à consistente HQ de aventura nesse país (Argentina), em todos os seus subgêneros e definições” (2006, p. 123).
Com o tempo, o compromisso político aumentou e a sua ideologia ficou mais nítida. Com Alberto e Enrique Breccia, escreveu a biografia em quadrinhos de Che Guevara, Vida Del Che, publicada em 1968, três anos após o assassinato do líder cubano – vendeu muito, até ser apreendida e destruída pelos censores da ditadura civil-militar argentina da época (no Brasil, só em 2008, pela Conrad Editora). No ano seguinte, escreveu O Eternauta, desenhada por Solano López, uma nova versão da história, com acentuado cunho político, inicialmente publicada em tiras semanais.
O Eternauta é “considerado o ‘livro sagrado’ e o ‘grande clássico’ dos gibis argentinos”, assegura o escritor e cientistas político Luiz Bernardo Pericás1 – na história, o personagem Juan Salvo, típico argentino pequeno-burguês caminha pelas principais ruas e avenidas de Buenos Aires, que agora estão desertas, cobertas por uma neve improvável; o cinza domina as cores, todos os lugares estão submetidos ao terror. Nas palavras de Oesterheld, “O verdadeiro herói de O Eternauta é um herói coletivo, um grupo humano… o único herói válido é o herói ‘em grupo’, nunca o herói individual, o herói solitário”2.
Entre 1973 e 1974 foi publicada a série América Latina: 450 años de guerra, desenhada por Leopoldo Durañona. Por ter sido veiculada no jornal El Descamisado, órgão do grupo montonero, Oesterheld jamais foi perdoado – nem pelo conteúdo, nem pela opção de veiculação.
Geólogo por formação, abandonou a profissão para se tornar escritor e roteirista de comic books. Seu primeiro conto para crianças, Truilla y Militar, foi publicado aos 23 anos, no jornal La Prensa. Escreveu um número impreciso de histórias, mas não menos de trinta mil páginas, de acordo com Goida (1990), entre ficção científica, aventuras no oeste e com temas bélicos, vendidas em quiosques e bancas de jornais.
Depois de pertencer a diferentes editoras (Abril, Codex, Columba e Record), fundou a La Editorial Frontera, em 1956, com a parceria do irmão Jorge. Além das revistas argentinas, colaborou com publicações do Chile (Más Allá, Cinemisterio, Misterix, Fantasia, El Tony, Skorpio e Zig Zag).
Durante a década de 1970 seu compromisso político se acentuou. Uniu-se ao grupo Montoneros (tal como em O Eternauta II), que finalizou na clandestinidade; foi sequestrado em 27 de abril 1977 e foi visto pela última vez em um centro de detenção, igualmente clandestino – mas, antes, percorrera um roteiro sinistro: Campo de Mayo, Vesubio e Sheraton. Ele é o número 7.546 da lista da Comissão Nacional dos Desaparecidos, uma das vítimas do terrorismo de estado na Argentina. Supõe-se que morreu em 1978, mas seu corpo ainda não foi encontrado.
Ainda segundo Pericás3, “Por alguns minutos lhe foi permitido ficar sem o capuz que cobrira sua cabeça, pouco tempo antes. Só então percebeu que estava na companhia de vários homens, tão machucados quanto ele. Era noite de Natal. Cumprimentou os prisioneiros, um a um. E ainda cantou ‘Fiesta’, de Joan Manuel Serrat. Depois disso, nunca mais seria visto.”
Teve quatro filhas, Estela Inês, Diana Irene, Beatriz Marta e Marina. Beatriz foi a primeira a desaparecer, aos 19 anos. Eram 1976 e foi a única que teve o corpo recuperado. Seguiu-se a ela Diana, grávida de quatro meses, mãe de Fernando, sequestrada com companheiro, Raúl, em San Miguel de Tucumán. Marina seria a próxima, também grávida. Por fim, Estela, casada, mãe de um menino de três anos de idade.2.
O sumiço do autor e de suas filhas serviu, tragicamente, para dar sentido à história narrada em O Eternauta. “O personagem é até hoje visto como um representante daqueles que desapareceram (ou melhor, ‘foram desaparecidos’) sem deixar pistas”, diz o jornalista Henrique Fernandes Coradini4. Em 2011, a Martins Fontes lançou uma edição de luxo da primeira versão do personagem. (A partir de GOIDA, 1990; PATATI e BRAGA 2206;  https://blogdaboitempo.com.br/2015/10/23/os-ultimos-passos-de-hector-oesterheld/1, 2, 3; http://lounge.obviousmag.org/aleatoriedades/2013/07/oesterhel-o-eternauta.html#ixzz5uSEg5UDi4; https://pt.wikipedia.org/wiki/H%C3%A9ctor_Germ%C3%A1n_Oesterheld).

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