Um dos melhores poetas modernos brasileiros, MARIO QUINTANA nasceu em Alegrete (RS), no dia 30 de julho de 1906. “Nasci prematuramente e fazia um grau abaixo de zero”, comentou, em entrevista para o Instituto Estadual do Livro (1996, p. 5). O poeta morreu numa quinta-feira, dia 5 de maio de 1994, há 25 anos, com uma temperatura que oscilava entre 15°C e 27°C. A primeira vez que publicou um poema foi aos 17 anos, um soneto – e com pseudônimo, J.B. Sá, porque o pai, o farmacêutico Celso de Oliveira Quintana, “não gostava de poetas” (1996, p. 6), queria que o filho se tornasse doutor, lembra Moacyr Scliar (1937-2011)1, em artigo para o jornal Folha de São Paulo, em 6 de maio de 1994. Suas produções literárias tornaram-se um pouco mais conhecidas do público quando se mudou para estudar em 1919, em Porto Alegre – a começar pela revista Hyloea, do colégio militar, onde estudava.
A grande virada para Mario começaria em 1924, quando foi trabalhar na Livraria do Globo, com o ítalo-brasileiro Mansueto Bernardi (1888-1966). Mas, precisou retornar ao Alegrete para ajudar na farmácia da família. Aos 23 anos, tendo morrido o pai e a mãe, Virgínia de Quintana Miranda, voltou à capital para trabalhar no jornal político-partidário O Estado do Rio Grande, dirigido pelo jornalista e político Raul Pilla (1892-1973), onde fazia uma seção chamada “O jornal dos jornais”: ele tinha que ler os demais jornais de Porto Alegre e outros do Rio de Janeiro e de São Paulo, e fazer um resumo. Ele também traduzia os telegramas que chegavam à redação com as notícias internacionais.
Antes de começar a trabalhar na Revista do Globo, publicou um poema na revista carioca Para Todos, dirigida pelo poeta Álvaro Moreyra (1888-1964). A partir de 1930, passa a colaborar com a Revista do Globo e também com a editora, sob direção de Henrique Bertaso (1906-1977), que, por sua vez, tinha a assessoria de Erico Verissimo (1905-1975). Como a Globo era responsável, no Brasil, por grandes autores da atualidade, Mario teve sua grande oportunidade. Fluente em inglês e francês, traduziu Virgínia Woolf (1882-1941), Lin Yutang (1895-1975), Aldous Huxley (1894-1953), Joseph Conrad (1857-1924), W. Somerset Maugham (1874-1965), Honoré de Balzac (1799-1850), Guy de Maupassant (1850-1893) e Giovanni Papini (1881-1956) – foram mais de 130 títulos da literatura universal. E, entre eles, Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust (1871-1922). “Uma barbaridade traduzir aqueles períodos que dão volta na esquina e não se sabe onde vão parar”, lembrou (1996, p. 5).
Publicou a primeira tradução em 1934 até que, em 1940, a Globo editou A rua dos cataventos, um livro de sonetos de Mario Quintana com temática infantil. Mais seis anos e publicaria Canções (1946), depois O Batalhão de Letras e Sapato Florido (1948). Ainda viriam O aprendiz de feiticeiro (1950), Espelho Mágico (1951) – com Monteiro Lobato (182-1948) fazendo comentários na orelha do livro – e Poesias (1962), até que, em 1966, sua obra começaria a ganhar projeção nacional: primeiro, recebeu o Prêmio Fernando Chinaglia; em 1980 foi homenageado com o Prêmio Machado de Assis pela Academia Brasileira de Letras (ABL) e recebeu o Prêmio Jabuti em 1981, como Personalidade Literária do Ano. No Rio Grande do Sul, tornou-se cidadão honorário de Porto Alegre em 1967 (“Antes, ser poeta era uma agravante, depois passou a ser uma atenuante e agora é uma credencial”), em 1968, foi homenageado pela Prefeitura com um busto (“Um engano em bronze é um engano eterno”), exposto no foyer da Casa de Cultura Mario Quintana (CCQM), e foi agraciado pelo Governo do Estado com a medalha Negrinho do Pastoreio em 1976, quando completou 70 anos. Em 2001, os escultores Xico Stockinger (1919-2009), que também esculpiu o busto, e Eloisa Tregnagno criaram o Monumento à Literatura, representado pelas estátuas de Mario conversando com Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), instalado na Praça da Alfândega, em Porto Alegre – e alvo de repetidos vandalismos.
Na edição de Poesias, os editores da Globo assim apresentam o poeta: “Ele não está simplesmente na primeira linha dos poetas brasileiros: na verdade, Mario Quintana assume uma posição que bem poucos dessa linha conseguiram assumir. Lido com igual carinho pelos que começam hoje a fazer literatura como por escritores já inteiramente consagrados do País, ele é também um nome popular, um artista que sensibiliza o público e o vai tornando cada vez mais amigo da poesia.” (in 1977).
Alzira Freitas Tacques, em 1956, era só elogios para “o poeta da simplicidade e da beleza”, “enamorado eterno da noite e do lirismo” (1956, p. 1258). “Sua Musa ora se mostra “seu nome ultrapassou já as fronteiras do Rio Grande, indo projetar-se até mesmo no Estrangeiro, onde já se tornou querido e consagrado” (1956, p. 1257). Ainda hoje, entretanto, o poeta “sofre de uma dupla apreciação: aquela feita pelos que o consideram um dos mais elaborados artífices da poesia brasileira e a dos que, sem desmerecer seus achados técnicos, consideram-no passadista e pouco inovador” (BRAVO, 2006, p. 47).
Mesmo reconhecido por leitores de diferentes regiões do país e do exterior, com diferentes graus de exigência, Mario Quintana ficou de fora da Academia Brasileira de Letras. Por três vezes tentou entrar, por três vezes foi negado. Ao ser convidado, recusou o convite. Sobre a situação, assim pronunciou-se o escritor Luis Fernando Verissimo: “Se Mario Quintana estivesse na ABL, não mudaria sua vida ou sua obra. Mas não estando lá, é um prejuízo para a própria Academia.” A mesma ABL que, em 1966, quando o poeta comemorou os 60 anos com a publicação da Antologia Poética (organizada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos), o saudou, na voz de Augusto Meyer e Manuel Bandeira – que escreveu o poema “Quintanares” e o recitou na ocasião (“Meu Quintana, os teus cantares/ Não são, Quintana, cantares:/ São, Quintana, quintanares,/ Quinta-essência de cantares.../ Insólitos, singulares.../ Cantares? Não! Quintanares!”).
Em 1980, a coletânea 80 anos de poesia foi considerada “uma consagração raramente vista na vida literária brasileira” (BRAVO, 2006, p. 47), acompanhada de uma exposição sobre sua vida. Em 1981, quando lançada a Nova Antologia Poética, foram acrescentados 40 poemas que não constavam na primeira. A publicação permitiu a redescoberta da poesia do alegretense e a fluência do poeta entre “fantasia e realidade, entre expressão de lirismo e densidade dramática”, como explicou a especialista Tania Franco Carvalhal sobre a totalidade da obra de Mario (in BRAVO, 2006, p. 47).
Um dos livros de Mario é Do Caderno H e outros poemas, que reuniu poemas curtos em prosa publicados originalmente nas páginas do jornal Correio do Povo, onde escreveu de 1953 até 1977, quando o jornal fechou as portas, ainda que temporariamente. Sobre a coluna que escrevia, o poeta disse: “Caderno H porque todas as coisas acabavam sendo escritas na última hora, na hora H, na hora final.” (1996, p. 8).
Com o fechamento do jornal, foi despejado do Hotel Majestic, localizado próximo ao prédio do Correio, no centro histórico de Porto Alegre, onde morou entre 1968 e 1980. Na ocasião, o ex-jogador de futebol Paulo Roberto Falcão (do Internacional e da Seleção Brasileira), cedeu um dos quartos do Hotel Royal, de sua propriedade. Para a amiga Dulce Helfer, fotógrafa dos 80 anos do poeta, comentou sobre o tamanho do quarto. E ouviu de Mario. “Eu moro em mim mesmo. Não faz mal que o quarto seja pequeno. É bom, assim tenho menos lugares para perder as minhas coisas.”
Porém, logo ele mudou-se para o Porto Alegre Residence, um apart-hotel, onde viveu até morrer, em 5 de maio de 1994, aos 87 anos. Em 1983, o Hotel Majestic foi tombado pelo município e transformado na Casa de Cultura Mario Quintana (CCQM), onde o quarto de Mario foi reconstruído em uma das salas, sob orientação da sobrinha-neta Elena, que havia sido secretária do poeta de 1979 a 1994. Mario Quintana encontra-se sepultado no Cemitério São Miguel e Almas, em Porto Alegre.
Em 2006, por ocasião do centenário, o poeta recebeu diversas homenagens em todo o Estado. De hoje (30 de julho de 2019) até dia 30 de agosto, a amiga-fotógrafa Dulce Helfer expõe 25 quadros de ausência, na Galeria de Arte da CCMQ. Também na Casa de Cultura, integrantes da Biblioteca Infantil Lucilia Minssen apresentam o “Sarauzinho Poético”, em parceria com o Centro de Desenvolvimento da Expressão (CDE), e foi destinado um espaço dedicado às publicações e outras imagens, organizado pelos funcionários da Biblioteca Pública Erico Verissimo; dois banners estarão expostos na área externa do prédio, idealizados por integrantes da Associação dos Amigos da CCMQ, para lembrar os 25 anos da morte do poeta. (A partir de CARVALHAL in QUINTANA, 2003; IEL, 1996, n. 6; QUINTANA in COLEÇÃO PETIT POA, 1991; QUINTANA, 1977; REVISTA BRAVO, 2006, n. 1; TACQUES, 1956; www.correiodopovo.com.br; https://www.suapesquisa.com/biografias/mario_quintana.htm; https://www.infoescola.com/escritores/mario-quintana/; https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_Quintana; www.revistaprosaeverso.com/marioquintana-um-retrato-biografico-do-poeta1)


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog