Aos 19 anos, o poeta alagoano GUIMARÃES PASSOS mudou-se para o Rio de Janeiro. Era a idade de
ouro da boêmia dos cafés e o poeta não poderia encontrar melhor ambiente para
viver. Nascido em 22 de março de 1867, foi um dos fundadores da Academia
Brasileira de Letras (ABL) – seu patrono foi o também boêmio Laurindo Rabelo (1826-1864);
foi sucedido por Paulo Barreto, mais conhecido como João do Rio (1881-1921).
Colaborou com os jornais Gazeta da Tarde, Gazeta de Notícias e A Semana, num grupo formado por Olavo Bilac (1865-1918),
Coelho Neto (1864-1934), José do Patrocínio (1853-1905) e Artur de Azevedo (1855-1908); em suas colunas, publicava
crônicas e versos, às vezes com pseudônimos, e exerceu o humor em sua
colaboração para O
Filhote.
Foi arquivista da Secretaria da Mordomia (!) da Casa
Imperial, mas, com a proclamação da República, Guimarães Passos passou a viver
unicamente do jornalismo e aderiu ao movimento revolucionário instalado no Paraná,
na luta contra Floriano Peixoto (1839-1895). Exilou-se em Buenos Aires durante 18 meses,
quando colaborou com os jornais La
Nación e La
Prensa, além de fazer conferências
literárias relacionadas ao Brasil. Quando retornou ao Rio de Janeiro, alguns
dos antigos companheiros ocupavam postos bem remunerados e reconhecidos,
enquanto ele permanecia como o último boêmio – era um poeta parnasiano, lírico
e um pouco pessimista.
Contraiu tuberculose e, sem recursos médicos no Brasil, mudou-se
para a ilha da Madeira (Portugal) e, depois, para Paris. Ao tratar de Versos de um simples (1891), José Veríssimo viu nele o “poeta delicado, de
emoção ligeira e superficial, risonho, de inspiração comum, mas de estro fácil,
como o seu verso, natural e espontâneo, poeta despretensioso, poeta no sentido
popular da palavra”, como podemos ver nos tercetos do soneto “XXIII”: “Faze de
mim um péssimo conceito,/ Esquece que eu existo e que meu peito/ Pelo teu peito
pulsa apaixonado.// Antes me odeies, e com dó profundo/ Digas um’hora: porque
veio ao mundo/ Quem havia de ser tão desgraçado!”. Publicou, ainda, Hipnotismo
(1900), Horas Mortas
(1901) e Tratado de Versificação,
com Olavo Bilac (1910).
Faleceu em Paris, em 9 de setembro de 1909; só em 1921, a
ABL conseguiu trasladar os seus restos mortais para o Brasil, que vieram
acompanhados dos de Raimundo Correia, falecido em 1911, também na capital
francesa.
* * * * *
ÉBRIO
Querem que eu ria, que o prazer alheio
Seja meu, que o partilhe e o acompanhe;
Que a ventura que banha aos outros, banhe
Meu negro peito de tristeza cheio.
Seja! Bradai; nenhum de vós estranhe
Mais nesta roda um rosto triste e feio;
Quero beber e rir, pois já não creio
Senão que existem males e champagne.
E uma taça após outra fui bebendo;
Sempre bebendo, vi dançar a mesa,
E os meus convivas fui desconhecendo.
Ébrio afinal, caí… mas não sozinho:
Comigo estavas, porque a natureza
Do meu amor embriaga mais que o vinho.
* *
* * *
MORTE
És negra, és negra, dizem-me os felizes,
Dizem que ao ver-te o vulto atro e sombrio,
Gelam-se os corações, tamanho frio,
Serena, espalhas onde quer que pises.
É que tu levas para um céu vazio,
Onde somente as dores tem raízes,
As esperança todas, e não dizes
Nada a quem fica, nem a quem partiu,
Anjo negro, terror da humanidade,
Morte, estilete que nos toca o fundo
D’alma, enchendo de mágoa e de saudade!
Morte, há no mundo tanta dor contida!
Que, tu, que findas todo o bem do mundo,
És a coisa melhor que há nesta vida.
* *
* * *
SEMPRE
Se eu não te disse nunca que te amava,
Perdoa-me, mulher, sou inocente:
Eu vivia de amar-te unicamente,
Unicamente em teu amor pensava.
Se os meus labios calavam-se, falava
O meu olhar apaixonadamente,
Porque, se o labio oculta o que a alma sente,
Conta o olhar o que o labio não contava.
Meu rosto triste, meu cismar constante,
Meu gesto, meu sorrir, tudo exalava,
Tudo exprimia um coração amante.
Em tudo o meu amor se denunciava,
Via-me em toda a parte e o todo o instante,
Se estavas longe, se comigo estava.
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