A poeta ISABELLA INGRA nasceu em Brasília (DF) no dia 20 de dezembro de 1993. É professora de literatura, atriz e contadora de histórias – são dela os livros O sonho de Caio e O dia em que Caio não sonhou (2016) voltados para o público infantil.

Seus poemas fazem parte da coletânea As mulheres poetas na literatura brasileira (v. 3, 2018), organizada por Rubens Jardins, e em revistas literárias eletrônicas, como arribacao.com.br, ruidomanifesto.com.br e diversossfins.com.br, entre outras. Este ano participou do vídeo Poema para a catástrofe do nosso tempo, de Alberto Pucheu, ao lado de Gerson Dudus (https://www.youtube.com/watch?v=3POdazf0m44). 

* * *


CONTOS DE FADAS PARTE DOIS


Nada foi real,

mas doeu como se fosse.

E aí o silêncio.

Eu não quero silenciar

Mas o primeiro grito

Sempre sai de mim

Na torre da gente

Na serpente que diz

Que o fruto do conhecimento

É atrevimento sem volta.


* * *


A DESOBEDIÊNCIA


e o querer encontrar contigo

num ato, numa cena oblíqua, onde não nos acovardamos.

É soco

É pontapé

bala de borracha na nossa lata

e ainda assim, a gente acorda domingo,

faz amor sorrindo e com um pouco de dor: gemidos.

Nosso povo tristemente teme. Não.


Nosso povo agoniza, num silêncio absoluto entre um urro e um gemido.

O desejo

suas nuances

Medo que a abundância

Provoca

Tão acostumados à escassez

O monismo feito absoluto

Amor único

E tudo vaza por todos os poros

Seres abertos que somos

A pele que se esfrega em tudo

Tão permissiva e úmida

a gente bota talco e antitranspirantes

Não quer que se perceba que estamos assim querendo mais

Mais corpo

Mais alma

Num tesão

Pelo infinito

De que somos feitos

A poeira cósmica soprada

se acopla a tudo

Nós

Esse ínfimo sem fim

Esse fim que justifica o meio

Porque é sempre

Pelo meio que isso nos atravessa.


* * *

03 DE JUNHO.


Acordei com uma pequena alergia. Olhos inchados. Nariz perturbado. Hoje, finalmente, disse:

Eu quero estar sozinha. Eu e meus segredos que separei um a um para me contar. Quero

estar sozinha pra chorar a morte do Miguel. Quero estar sozinha pra chorar a morte do João.

Do George, da Marielle.

Mas não há solidão bastante pra chorar a morte de todos.

Não há isolamento bastante pra chorar a morte de todos.

Não há lágrimas o bastante pra chorar a morte de todos.

Não há alergia o bastante pra reclamar a morte de todos.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog