O poeta JOSÉ CARLOS CAPINAN nasceu no dia 19 de dezembro de 1941 em Esplanada (BA). Mais conhecido como letrista, com forte vínculo com o movimento tropicalista, publica Inquisitorial em 1966. Em 1989 é a vez de Confissões de Narciso e Balança mas Hai Kai; o quarto livro, Uma canção de amor às árvores desesperadas é de 1996. Publicou, ainda, Signo de Navegação Bahia e Gente e Estrela do Norte, Adeus.

O primeiro texto foi escrito em 1963, Bumba meu boi, peça musicada por Tom Zé. Naquela época, Capinan morava em Salvador, cursava a faculdade de Direito na Universidade Federal da Bahia (UFBA), frequentava o Centro Popular de Cultura (CPC) e já havia feito contato com Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Mudou-se para São Paulo e começou a trabalhar como redator publicitário. Escreveu, em coautoria com Caetano Veloso e Torquato Neto, a peça Pois é (1965), apresentada por Gil, Maria Bethânia e Vinicius de Moraes no Teatro Opinião, no Rio de Janeiro. No mesmo ano, escreve com Caetano a trilha sonora do documentário Viramundo de Geraldo Sarno, que teve a música composta por Gil e interpretada por Bethânia.

Em 1966, Nara Leão grava “Ladainha”, dele e de Gil, compõe “Canção para Maria”, musicada por Paulinho da Viola (terceiro lugar no 2º Festival de Música Popular Brasileira da TV Record), e retorna a Salvador, onde conclui a faculdade de Medicina.

No ano seguinte, ao lado de Torquato Neto, faz o roteiro de Vida, Paixão e Banana do Tropicalismo, para a televisão, que teve a direção de José Celso Martinez Corrêa; vence o 3º Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, com “Ponteio”, em parceria com Edu Lobo, com quem assinará outras canções; com Gil, escreve “Água de Meninos” e “Aboio”.

São várias outras composições até o final da década de 1980. Entre elas: “Soy Loco por ti, América” e “Misere Nobis”, com Gil (do disco Tropicália: ou Panis et Circensis), “Gotham City”, com Jards Macalé (para o 4º Festival Internacional da Canção, da Globo, em 1969); novamente com Paulinho da Viola e Edu Lobo, com Mirabô Dantas e Geraldo Azevedo, e no início dos anos 80, com João Bosco compõe “Papel Machê”.

Em 1984 estruturou a TV Educativa da Bahia e em 1985 atuou como diretor da emissora. Foi nomeado secretário municipal da Cultura em Camaçari (BA), em 1986, e do Estado para a gestão 1987-1989, quando presidiu os fóruns Nacional de Secretários da Cultura e Estadual de Cultura. Integrou, ainda, o Conselho Nacional de Direito Autoral do Ministério da Cultura (MinC).


* * *



MUDANDO DE CONVERSA


Não me venham falar de éticas

Prefiro locomotivas

Ou motivos loucos para ser feliz

Prefiro vagões de urânio e feijão

Atravessando o país

Vendo o povo acenando lenços brancos

(Campos férteis)

Aos que vão sul a norte

Leste oeste

Trilhos novos, outros brasis


E eu menino outra vez a dar adeus aos tempos da antihistória

Quero sorrir das janelas de trens supersônicos

Em trilhos magnéticos

E novamente pensar que podemos alcançar as estrelas


* * *


O REBANHO E O HOMEM


O rebanho trafega com tranqüilidade o caminho:

É sempre uma surpresa ao rebanho que ele chegue

Ao campo ou ao matadouro.

Nenhuma raiva

Nenhuma esperança o rebanho leva.

Pouco importa que a flor sucumba aos cascos

Ou ainda que sobreviva.

Nenhuma pergunta o rebanho não diz:

Até na sede ele é tranquilo

Até na guerra ele é mudo.

O rebanho não pronuncia,

Usa a luz mas nunca explica a sua falta

Usa o alimento sem nunca se perguntar

Sobre o rebanho o sexo

Que ele nunca explicara

E as fêmeas cobertas

Recebem a fecundidade sem admiração.

A morte ele desconhece e a sua vida.

No rebanho não há companheiros,

Há cada corpo em si sem lucidez alguma.


O rebanho não vê a cara dos homens

Aceita o caminho e vai escorrendo

Num andar pesado sobre os campos.


* * *


NARCISO


Enquanto nos atormentam as furiosas serpentes da


solidão


Eu sei de ti, como nenhum menino sabe de si mesmo

E te salvo da sombra de todos os teus espelhos

De onde emergem intactas as imagens claras da


compaixão


E cai no fundo das águas o céu do verão

Frutas vermelhas amadurecem o peco desejo

Há um cardume de ânsias mergulhadas no peito

Estás com ar transfigurado, a insone paixão

Nunca abandona o insondável aquário

E disfarças como ontem o inevitável beijo

Anunciando a Narciso seu adiado naufrágio


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