CLAUDIO WILLER nasceu no dia 2 de dezembro de 1940, em São Paulo (SP). Poeta, ensaísta, crítico e tradutor, é pós-doutor em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), com o tema “Religiões estranhas, misticismo e poesia”.

Seu primeiro livro de poemas é Anotações para um apocalipse, de 1964. Desde sempre, esteve ligado aos movimentos surrealista e da geração beat, ao lado de Sergio Lima e Roberto Piva.

Crítico e ensaísta literário, escreveu para diversos jornais, como a Folha de S. Paulo e o Jornal do Brasil (no caderno “Ideias”) e revistas, como IstoÉ e Cult, além de publicações alternativas – Linguagem Viva, Muito Mais e jornal Versus, entre outros.

Tem trabalhos publicados em antologias e coletâneas do Brasil e no exterior (Antologia poética da geração 60 e Modernismo Brasileiro und die Brasilianische Lyrik der Gegenwart), e também é organizador, como a coleção Vozes Contemporâneas, de 2018, que, entre outros, é citado em obras de história da literatura brasileira, como as de Alfredo Bosi e José Paulo Paes. Está presente em filmes e vídeos (como Antes que eu me esqueça, de 1977, e o longa-metragem Filmedemência, de 1985).

Formado em Sociologia e Psicologia, também ocupou cargos públicos de administração cultural e presidiu a União Brasileira de Escritores (UBE). Ao lado de Floriano Martins, editou a revista eletrônica Agulha. Realizou cursos e palestras, e coordenou oficinas literárias em universidades, casas de culturas e outras instituições.

Como tradutor, é dele a edição de Os Cantos de Maldoror, de Lautréamont (Vertente, 1970), Escritos de Antonin Artaud (L&PM, 1986), Lautréamont – Obra completa (Iluminuras, 1997, 2014) e Livros de haicais, de Jack Kerouac (L&PM, 2013). Seu trabalho também pode ser lido em claudiowiller.wordpress.com.

 

* * *


 

À TARDE


olhar com o olhar espantado

o voo do primeiro pássaro noturno

e saber que em breve

haverá algum tipo de confronto

de alucinação coletiva, uivo geral

saber

que por trás do olho

guardamos uma planície de risadas

dobrada em algum desvão da alma


– a sensação lisérgica de estar aí

e perceber

a fumaça dos últimos acampamentos

a casa na encosta do morro

o albatroz que arrepia sua trajetória

os mosquitos que zumbem e que zumbem e que zumbem

nesta tarde

em que três petroleiros se encaram

e trocam sinais ao largo

e uma memória nos persegue

de rios, cataratas e pororocas

nesta praia

que é fim e começo

de qualquer coisa já sabida e possuída

e oculta

no oco da última fibra nervosa


* * *


POÉTICA

 

1

então é isso

quando achamos que vivemos estranhas experiências

a vida como um filme passando

ou faíscas saltando de um núcleo

não propriamente a experiência amorosa

porém aquilo que a precede

e que é ar

concretude carregada de tudo:

a cidade refletindo para sua hora noturna e todos indo para casa ou então

marcando encontros improváveis e absurdos, burburinho da multidão circulando

pelo centro e pelos bairros enquanto as lojas fecham mas ainda estão iluminadas,

os loucos discursando pelas esquinas, a umidade da chuva que ainda não passou,

até mesmo a lembrança da noite anterior no quarto revolvendo-nos em carícias e

expondo as sucessivas camadas do que tem a ver – onde a proximidade dos

corpos confunde tudo, palavra e beijo, gesto e carícia

TUDO GRAVADO NO AR

e não o fazemos por vontade própria

mas por atavismo


2

a sensação de estar aí mesmo

harmonia não necessariamente cósmica

plenitude muito pouco mística

porém simples proximidade

da aberrante experiência de viver

algo como o calor

sentido ao lado de uma forja

(talvez devesse viajar, ou melhor, ser levado pela viagem, carregar tudo junto,

deixar-se conduzir consigo mesmo)

ao penetrar no opalino aquário

(isso tem a ver com estarmos juntos)

e sentir o mundo na temperatura do corpo

enquanto lá fora (longe, muito longe) tudo é outra coisa

então

o poema é despreocupação




 

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