O poeta JAIME VAZ BRASIL nasceu no dia 30 de dezembro de 1962, em Bagé (RS). Estreou com Pinhais do Minuano em 1991. Vieram outros livros – como Inventário de Cronos (2002) e Clave de Sombra (2014) – e diversas premiações, e, entre elas, o Prêmio Açorianos (por Livro dos Amores, em 2000) e o Felippe d’Oliveira, pelo poema “A primeira morte”.

Seus poemas também podem ser encontrados nos CDs Os olhos de Borges – musicados por vários artistas – e Pandorga da Lua (2006), com o músico Ricardo Freire, que é voltado ao público infantil e que lhe rendeu outro Açorianos.

Como letrista, conquistou o Prêmio Açorianos com o CD Ivo Fraga interpreta Jaime Vaz Brasil (em três categorias). Também ganhou o Açorianos de Melhor Composição para o Teatro, em parceria com Flávio Vaz Brasil, e o Troféu Aparício Silva Rillo, como melhor letrista da Califórnia da Canção, de Uruguaiana (RS), além de vários prêmios no Moenda da Canção, em Santo Antônio da Patrulha (RS).

Médico, psiquiatra e psicoterapeuta, foi diretor técnico e docente do curso de formação em Psicoterapia do Instituto Fernando Pessoa, em Porto Alegre.


* * *



MILONGA DE UM COMBATENTE NO CÁRCERE


Deste ponto onde me encontro

o meu mundo é meu espaço.

Verticais cilindros negros

me cerceiam como laços.


Desta cela onde me acho

meu espaço é só limites.

Os verbos da vida livre

aqui não há quem recite.


E além do espaço pouco

meus limites são imensos.

Entre esperas que não findam

a minha vida repenso.


Nem a morte a chegar perto,

nem a dor mais lancinante

têm mais rigores que as dores

que hoje em mim são constantes.


A meu redor busco um meio

que a liberdade resgate.

Forjaram estas paredes

meu exílio dos combates.


Em mim, as rédeas do tempo

no potro lerdo dos dias

domam horas indeléveis

e amenizam rebeldias.


E, mansamente, despejam

a dor mais dura e mais lenta.

Em nada existe sentido

se a liberdade se ausenta.


* * *


MILONGA BORGEANA


Dentro do livro de areia

A ampulheta do tempo

Virou do avesso.


Quase sangrando nos becos

A fome de um tigre

Em mim.


E farejei as palavras no ar

A mão do vento se abriu

E pôs em folha suspensa

A Milonga Borgeana.


Mil criaturas da noite

Transpassam inquietas

Os vidros de um bar.


Monstro Aqueronte passeia

Na ponta dos pés

Em nós.


Deu-me um espelho esquisito e falou

Da forma que a vida tem

De pôr no rosto uma cara

Que a alma desdenha.


Milonga Borgeana

Milonga de sombra.


Um tigre de quatro cores

Perdeu-se em teu labirinto.


Milonga Borgeana

Espada de vento


Nas calles de Buenos Aires

Nas calles de mis entrañas.


El viejo tiempo se espraia

Circula a doutrina

E suspende o punhal.


No corredor

Os rangidos do piso

São tão iguais...


Gume afiado, o destino que fez

A mão do escuro fechar

E pôr em muro de sombra

A milonga Borgeana.


Abre-se a fresta del sueño

E se adentra um mistério

Um segredo e o frio.


Entro com eles

No espanto da casa

Del Asterion.


Ah, quem me dera eu pudesse tocar

Um solo de bandonéon

Ao olho atento que mira

O futuro e o mundo...


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