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O poeta EDUARDO STERZI nasceu em Porto Alegre, no dia 7 de junho de 1973. Seu primeiro livro de poesia é Prosa, de 2001 – Prêmio Açoriano de Literatura, categoria Auto-Revelação em Poesia, em 2002 –, prefaciado pelo crítico literário João Alexandre Barbosa (1937-2006), e veio antes de ele editar a revista de poesia Cacto, com o poeta e crítico literário Tarso de Melo (quatro números, entre 2000 e 2004). Depois, ainda publicou Aleijão, em 2009 (premiado com Prêmio Alphonsus de Guimaraens, da Fundação Biblioteca Nacional em 2010), e Maus Poemas, em 2016.
Seus poemas podem ser encontrados em edições das revistas Inimigo Rumor, Cult, VOZ e Poesia Sempre, no caderno “Mais!”, da Folha de S.Paulo, e na antologia Na virada do século, organizada por Frederico Barbosa e Cláudio Daniel.
Também organizou o livro Do céu do futuro: cinco ensaios sobre Augusto de Campos (2006), e desenvolveu estudos literários em Por que ler Dante e A prova dos nove: alguma poesia moderna e a tarefa da alegria, ambos em 2008. Publicou, em 2011, três peças teatrais em Cavalo sopa martelo, e teve os artigos “Drummond e a poética da interrupção” e “O mito dissoluto”, incluídos em Drummond Revisitado (organizado por Reynaldo Jardim) e no número 3 da Rivista di Studi Portoghesi e Brasiliani, respectivamente.
Jornalista e professor, é doutor em Teoria e História Literária pela UNICAMP (Campinas, SP), e obteve o pós-doutorado na Universidade de São Paulo e na Università degli Studi di Roma La Sapienza, com ênfase em Teoria da Literatura – tendo como objetos de estudo a poesia moderna brasileira e contemporânea, Murilo Mendes, Augusto de Campos, Dante Alighieri, entre outros.


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PROSA DE UM DOMINGO

A máquina do corpo, resumida nos sentidos,
dissolve a tempestade num cheiro de chuva:
recorda-me, qual súbita visagem
(sutilmente engastada
no tempo presente),
a dor de ser
sem ter
sido.

Nada
(nem cheiro
nem tempestade),
mesmo que reviva,
num segundo abençoado,
a sensação de uma outra vida (frágil
como a própria infância, dor secreta do poema),
pode, fugaz, dar-me a garantia de ter vivido.

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SALVO-CONDUTO

Aquele que usa barba
se esconde
atrás da sua barba
como aquele que tem
nariz
se esconde
atrás do seu nariz
mas ninguém lhe pede
que raspe o nariz
para o retrato
da carteira
de identidade
nem lhe pede
que raspe o nariz
se quiser voltar
um dia
ao seu país

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DESAPARIÇÃO

                             the inconceivable Idea of the sun
                                                    Wallace Stevens

Sereno, à flor do tempo,
recomponho o desejo
de estar vivo. Vejo
entrar pela janela
o mesmo sol de sempre;
finjo que não conheço
seu calor, sua máscara
amarela, hepática.
Sei mais da natureza
das nuvens, e do vácuo
entre as estrelas, negra
matéria; no entanto,
quando me entrego ao sol,
integro-me ao ser sol:
narciso mais que cego,
narciso cegaluz.

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LIÇÃO DE ESCRITA

Não meça
a temperatura: pouco
importa se o corpo
dá-se, agora,
em forma
de colapso.
Esqueça
a máscara tesa
que sequestra o sorriso
por sob
a pele.
Releve
a agulha inclusa
que te paralisa
beijo e protesto.
Reserve
uma hora diária
para afagar tua miséria.
Ou resista:
não vale a escrita.

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