A poeta LYA LUFT
nasceu em 15 de setembro de 1938, em Santa Cruz do Sul (RS). Formada em
Pedagogia e em Letras, pela PUC/RS, publica o primeiro livro, Canções de Limiar, em 1964, que havia
sido premiado o Concurso Estadual de Poesias do Instituto Estadual do Livro
(IEL) dois anos antes. Entre outros, escreveu O lado fatal (1989), Secreta
Mirada (1997) e Para não dizer adeus
(2005).
Ao longo de sua atividade como escritora escreveu
romances – O tigre na sombra, de
2012, foi premiado com troféu Machado de Assis, da ABL –, contos – Histórias do Tempo (2000) –, crônicas – A riqueza do mundo (2011) e As coisas humanas (2020) – e ensaios – O rio do meio ganhou o prêmio de Melhor
Obra de Ficção do ano, em 1996, da APCA, e Perdas
e Ganhos –, além de traduzir outros autores, como Günter Grass, Hermann
Hesse e Virgina Wolf, e, em 2001, ganhou o Prêmio União Latina de Melhor Tradução
Técnica e Científica, com Lete: Arte e crítica do esquecimento, de Harald Weinrich. Tem mais de 20 livros,
com vários traduzidos para diversos idiomas.
Publica o romance As parceiras, em 1980, mas é com o livro de ensaios Perdas e Ganhos, de 2003, que torna-se reconhecida nacionalmente. Em 2004, passa a assinar uma coluna na revista Veja e também em jornais gaúchos.
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TÃO
SUTILMENTE EM TANTOS BREVES ANOS
Tão sutilmente em tantos
breves anos
foram se trocando sobre os
muros
mais que desigualdades,
semelhanças,
que aos poucos dois são um,
sem que no entanto
deixem de ser plurais:
talvez as asas de um só
anjo, inseparáveis.
Presenças, solidões que vão
tecendo a vida,
o filho que se faz, uma
árvore plantada,
o tempo gotejando do
telhado.
Beleza perseguida a cada hora,
para que não baixe
o pó de um cotidiano
desencanto.
Tão fielmente adaptam-se as
almas destes corpos
que uma em outra pode se
trocar,
sem que alguém de fora o
percebesse nunca.
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A
CASA INVENTADA
A vida é uma casa que a
gente inventa
(ou tenta).
Com um sótão para sonhar,
porões para chorar,
um quintal para as festas e
os delírios.
No meio porém passam as
águas do tempo
que tudo leva de roldão,
tudo
transforma em cacos, trapos,
lascas.
Melhor montar as ondas
agarrada nas espumas, e
deixar-se levar
entre estrelas, escolhas
e destroços.
Melhor se reinventar.
Melhor contemplar.
(Melhor ainda, nadar.)
Ou ele nos devora, nos cospe
fora
como sementes ou cascas.
Um dia vamos achar na praia
o que sobrou de nós:
que não sejam só os ossos.
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NASCIMENTO
Viver é a cada dia
partejar a vida.
Que esforço, que dor,
que tempo de espera.
Ela pode nascer com muitos
braços
cabeça grande demais
(– às vezes sem pernas).
Abro meu ventre,
minha alma se arreganha
como uma parturiente:
dar à luz dói.
Faço isso todos os dias,
como num palco:
aquele bonequinho
sou eu
num mundo que vou montando.
Mas num tudo me assusta,
nem tudo me prende:
posso abrir algumas portas,
posso fechar outras, posso
escolher o sexo
e a cor dos olhos de cada
momento.
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