ELIANE POTIGUARA nasceu em 29 de setembro de 1950, no Rio de Janeiro (RJ). É escritora, poeta, professora, ativista indígena e contadora de histórias. Seu livro mais conhecido é Metade cara, metade máscara (2004), mas também publicou A terra é mãe do índio (1989), Akajutibiró: terra do índio potiguara (1994) e Sol do pensamento (versão e-book, 2005), e para o público infantojuvenil os livros A cura da terra (2015), O pássaro encantado (2014) e O coco que guardava a noite (2004).

Escreveu sete livros, tem publicações em diversos sites, antologias e e-books, e recebeu prêmios – entre eles o PEN Club da Inglaterra e do Fundo Livre de Expressão, dos Estados Unidos. Participou de diversos congressos literários e sobre direitos humanos no Brasil e no exterior.

É formada em Letras (Português-Literaturas) e Educação pela UFRJ, especializada em Educação Ambiental pela UFOP; fundadora do GRUMIN / Grupo Mulher-Educação Indígena, é membro do Comitê Intertribal, Instituto Uka, Ashoka, Enlace Continental de mulheres Indígenas, Associação pela Paz, Cônsul de Poetas Del Mundo e embaixadora da Paz pelo Círculo De escritores da França e Suíça. Trabalhou pela Declaração Universal dos Direitos Indígenas na ONU em Genebra.

Indicada em 2005 ao Projeto Internacional “Mil mulheres ao Prêmio Nobel da Paz”, desde 2011 é Embaixadora Universal da Paz, ligada à ONU, e por sua contribuição à cultura, foi nomeada pelo governo brasileiro em 2014 na Ordem do Mérito Cultural na classe “Cavaleiro”.

* * *


NESTE SÉCULO DE DOR


Neste século já não teremos mais os sexos.

Porque ser mãe neste século de morte

É estar em febre pra subexistir

É ser fêmea na dor

Espoliada na condição de mulher


Eu repito

Que neste século não teremos mais os sexos

Tão pouco me importa que entendam

Possam só compreender em outro século besta


Não temos mais vagina, não mais procriamos

Nossos maridos morreram

E pra parir indígenas doentes

Pra que matem nossos filhos

E os joguem nas valas

Nas estradas obscuras da vida

Neste mundo sem gente

Basta um só mandante


Neste século não teremos mais peitos

Despeitos, olhos, bocas ou orelhas

Tanto faz sexos ou orelhas

Princípios, morais, preconceitos ou defeitos

Eu não quero mais a agonia dos séculos...

 

Neste século não teremos mais jeito

Trejeitos, beleza, amor ou dinheiro

Neste século, oh Deus (?!)

Não teremos mais jeito.


* * *


FANTASIAS DESERTAS


Não tenhas medo, IANUÍ

Que não vou-te enfeitiçar

O nada, eu quero de ti

Pro nada talvez vou partir.

Poema de Amor?

Sei lá... se poema de amor !...

Só sei que me passa essa chama

E que me queima a alma errante.

Horas, mas dias, mil noites

Relembro teu corpo parado

Feito máscara imóvel ao vento

Doido a flutuar nos mares quentes.

Pássaro louco bicando os peixes

Engorda teu peito aberto

Inflama teu coração militante

É tua, essa paixão dos séculos

Mas te guardas feito tatu

Que não é chegada a hora

Enfia teus dedos na terra

Desafoga as dores nela!

Mira pros céus navegantes

De teu barco em flor e vela

E rouba todas as forças solares

E renasce Boto, amante, mais belo.

Engorda teu peito aberto

Aquece o coração nu noutras eras

Alimenta tuas veias em asas

Nas fantasias desertas

Corre pelos cajueiros e arrozais

Que te trago essa cana caiana

E outras limas pra melar nossas bocas

E relaxar no calor das manhãs


Eu não te quero mais puro

Entrega-te que te vejo criança

Amor pronto a explodir

Fogo eterno, quem sabe?...

Ou vou partir, antes mesmo de vir

Num calor aberto semente...

Numa ilusão e sonho somente...

Nessa estrada longa, errante


Sendo meu caminho tão farto

Sendo teu peito tão forte


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