Nascido em 12 de setembro de 1831, em São Paulo, o poeta, contista e dramaturgo Manuel Antônio ÁLVARES DE AZEVEDO publicou apenas alguns poemas, artigos e um discurso comemorativo em vida. A obra poética mais conhecida de Azevedo é Lira dos Vinte Anos, publicada postumamente (1853)

Integrou a geração de poetas românticos que se sentia uma “geração perdida” – ao lado de Casimiro de Abreu (1839-1860), autor do poema “Meus oito anos”, e Fagundes Varela (1841-1875), autor de “Cântico do Calvário”. A melancolia em Álvares de Azevedo também foi revelada na peça teatral Macário (1852), nos contos de Noite na Taverna (1855) e no poema O Conde Lopo (1866)

Formou-se em Direito e viveu entre os estudos acadêmicos, o ócio, os casos amorosos e a leituras de Lord Byron (1788-1824) e Alfred de Musset (1810-1857), cujo estilo de vida procurava imitar – um na entrega ao spleen, outro na artificialidade do “mal do século”.

Faleceu devido à tuberculose, aos 20 anos, depois de complicações resultantes de um acidente enquanto andava a cavalo, no Rio de Janeiro em 25 de abril de 1852 – um mês antes, escrevera “Se eu morresse amanhã”, que foi lido por Joaquim Manuel de Macedo durante o enterro do poeta.

* * *


PASSEI ONTEM A NOITE JUNTO DELA


Passei ontem a noite junto dela.

Do camarote a divisão se erguia

Apenas entre nós e eu vivia

No doce alento dessa virgem bela...


Tanto amor, tanto fogo se revela

Naqueles olhos negros! Só a via!

Música mais do céu, mais harmonia

Aspirando nessa alma de donzela!


Como era doce aquele seio arfando!

Nos lábios que sorriso feiticeiro!

Daquelas horas lembro-me chorando!


Mas o que é triste e dói ao mundo inteiro

É sentir todo o seio palpitando...

Cheio de amores! E dormir solteiro!


* * *


SE EU MORRESSE AMANHÃ


Se eu morresse amanhã, viria ao menos

Fechar meus olhos minha triste irmã;

Minha mãe de saudades morreria

Se eu morresse amanhã!


Quanta glória pressinto em meu futuro!

Que aurora de porvir e que amanhã!

Eu perdera chorando essas coroas

Se eu morresse amanhã!


Que sol! que céu azul! que doce n'alva

Acorda a natureza mais louçã!

Não me batera tanto amor no peito

Se eu morresse amanhã!


Mas essa dor da vida que devora

A ânsia de glória, o doloroso afã...

A dor no peito emudecera ao menos

Se eu morresse amanhã!


* * *


LEMBRANÇAS DE MORRER


Eu deixo a vida como deixa o tédio

Do deserto, o poento caminheiro,

– Como as horas de um longo pesadelo

Que se desfaz ao dobre de um sineiro;


Como o desterro de minh’alma errante,

Onde fogo insensato a consumia:

Só levo uma saudade – é desses tempos

Que amorosa ilusão embelecia.


Só levo uma saudade – é dessas sombras

Que eu sentia velar nas noites minhas.

De ti, ó minha mãe, pobre coitada,

Que por minha tristeza te definhas!


Se uma lágrima as pálpebras me inunda,

Se um suspiro nos seios treme ainda,

É pela virgem que sonhei, que nunca

Aos lábios me encostou a face linda!


Só tu à mocidade sonhadora

Do pálido poeta deste flores.

Se viveu, foi por ti! e de esperança

De na vida gozar de teus amores.


Beijarei a verdade santa e nua,

Verei cristalizar-se o sonho amigo.

Ó minha virgem dos errantes sonhos,

Filha do céu, eu vou amar contigo


Descansem o meu leito solitário

Na floresta dos homens esquecida,

À sombra de uma cruz, e escrevam nela:

Foi poeta - sonhou – e amou na vida.


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