O poeta JORGE ADELAR FINATTO nasceu no dia 1º de novembro de 1956, em Caxias do Sul. Seu primeiro livro, Viveiro, é de 1981. Com O habitante da bruma recebeu o Prêmio Fernando Pessoa, da União Brasileira de Escritores em 2000.

Entre outros, publicou Navegador de barco de papel (2019), Memorial da vida breve (2007) e O Fazedor de Auroras (1990), título que também dá nome ao blog que mantém desde 2009, onde publica poemas, crônicas e fotografias.

Foi diretor do Departamento de Cultura e editor do Caderno de Literatura da AJURIS.


* * *


O PROCESSO


Sou habitante

da beira do rio

condenado
a não ver o rio


afundado em seco

decifro papéis

que nada me dizem


a página em branco

espera o verso

que não escreverei


o que encontro

no gabinete

a essa hora

da manhã

é não ter tempo

pra mais nada


enfrento a trama

invencível

a dor sem abrigo


a grande trituração

das almas

no processo


resta apenas

o duro ofício

que não pode

ser adiado


impossível fugir


o carteiro

envelhece

enquanto aguarda

as cartas

que não enviarei


observo por um momento

o voo branco

da gaivota

sobre o Guaíba


nesse instante

invade-me a tristeza

do prisioneiro

(a essa hora da manhã)


desapareço

na névoa


* * *


AO QUE PARTE


Um pedaço de ti rompe a neblina.

                                         Carlos Drummond de Andrade 


Quem te acolherá

na distante cidade

que agora dorme

emoldurada

sob antigas luzes

abandonada

em si mesma?


atravessas o Atlântico

e gotas do mar

grande mar da diáspora

enchem teus olhos


quem tocará tua face

quando lá chegares

insone e áspero

no meio da ventania?


na cidade estrangeira

haverá alguém

esperando

em solidária vigília?


dói a memória

dos que partiram

e partindo perderam-se

no sombrio traçado

de um mapa rasgado


és palavra

na tenebrosa

escuridão

que te cerca


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