LUBI PRATES é poeta, tradutora, editora e curadora de literatura, nascida no dia 7 de novembro de 1986, em São Paulo (SP). O primeiro livro, coração na boca, é de 2012; triz é de 2016, si país, de 2018 (no Uruguai), um corpo negro, de 2019 (Prêmio Jonathas Salathiel de Psicologia e Relações Raciais, do Conselho Regional de Psicologia), mais as plaquetes permanece, e de lá, daqui.

Engajada em ações contra a invisibilidade de mulheres e negros, participou da organização dos festivais literários [eu sou poeta], em São Paulo (2016) e Otro modo de ser, em Barcelona (Espanha, 2018), foi uma das curadoras do Clube de Leitura Antirracista, no Centro Cultural São Paulo (2019), organizou a antologia GOLPE: antologia-manifesto (2019) e é sócia-fundadora da nosotros, editorial, e responsável pela revista literária Parênteses.

Em 2018 foi convidada do Festival Literário de Votuporanga, do Festival Internacional de Poesia do Uruguai e do La Juntada, Festival Internacional de Poesia Jovem, da Argentina; em 2019 organizou a antologia Nossos poemas conjuram e gritam, com textos de Jarid Arraes, Lívia Natália, Natasha Feix, Esmeralda Ribeiro, Nina Rizzi e Conceição Evaristo. É dela a tradução de Poesia completa, da poeta afro-estadunidense Maya Angelou, em 2020.

Formada em Psicologia (contemplada com o, é doutoranda em Psicologia do Desenvolvimento Humano na USP. 

* * *

 

não foi um cruzeiro

 

meu nome e

minha língua

 

meus documentos e

minha direção

 

meu turbante e

minhas rezas

 

minha memória de

comidas e tambores

 

esqueci no navio

que me cruzou

o Atlântico.

 

* * *

 

para este país

 

para este país

eu traria

 

os documentos que me tornam gente

os documentos que comprovam: eu existo

parece bobagem, mas aqui

eu ainda não tenho esta certeza: existo.

 

para este país

eu traria

 

meu diploma os livros que eu li

minha caixa de fotografias

meus aparelhos eletrônicos

minhas melhores calcinhas

 

para este país

eu traria

meu corpo

 

para este país

eu traria todas essas coisas

& mais, mas

 

não me permitiram malas

 

: o espaço era pequeno demais

 

aquele navio poderia afundar

aquele avião poderia partir-se

 

com o peso que tem uma vida.

 

para este país

eu trouxe

 

a cor da minha pele

meu cabelo crespo

meu idioma materno

minhas comidas preferidas

na memória da minha língua

 

para este país

eu trouxe

 

meus orixás

sobre a minha cabeça

toda minha árvore genealógica

antepassados, as raízes

 

para este país

eu trouxe todas essas coisas

& mais

 

: ninguém notou,

mas minha mala pesa tanto.

 

* * *

 

minha cidade tem uma ferida

aberta, um rastro

onde corre um rio

 

sujo

 

eu tenho uma ferida

aberta, um rasgo

onde corre sangue

 

sujo

 

e por décadas procurei

sinais cosmopolitas de nascença

este:

 

agora

 

a poça de sangue aos

meus pés

escorre

 

do meu rasgo para

a ferida aberta desta

terra e

 

se eu me deito sobre esta cidade

imediatamente

ela tem o meu tamanho

 

falamos do que é sujo.

 

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