NARCISA
AMÁLIA DE CAMPOS, poeta, professora e
jornalista, nasceu em 3 de abril de 1852, em São João da Barra, no Rio de
Janeiro. Sua carreira teve início como tradutora de contos e ensaios de autores
franceses, como os de George Sand (pseudônimo masculino de Amandine Aurore
Lucile Dupin, 1804-1876), reunidos em livro anos mais tarde.
A única obra poética autoral
é de 1872, Nebulosas, publicada pela
Garnier, elogiada por Machado de Assis (1839-1908), admirada pelo Imperador D.
Pedro II (1825-1891) e reeditada em 2017 pela Fundação Biblioteca
Nacional/Gradiva Editorial. Ela tinha 20 anos e, em 1873, recebeu o prêmio “lira
de ouro” da Câmara Municipal de Resende; no ano seguinte, foi premiada com uma
pena de ouro pela Mocidade Acadêmica do Rio de Janeiro.
A publicação, de acordo com
Antônio Candido, “criou certa expectativa nos meios literários. Nada mais
produziu, todavia, de apreciável” (1997, p. 341). Entretanto, outros textos
apareceram em 1874, 1888 e 1917 no Novo
Almanaque de Lembranças (criado em
1851 com o nome Almanaque de Lembranças,
com circulação no Brasil e em Portugal), e no livro Nelúmbia, coletânea de contos publicada em 1874.
Difamada em Resende, onde
morava, pelo marido ciumento, mudou-se para a capital carioca, onde abandonou a
literatura para dedicar-se ao magistério. Como jornalista – a primeira mulher a
se profissionalizar na atividade –, fundou o impresso quinzenal O Gazetinha, que tinha como subtítulo
“folha dedicada ao belo sexo”, encartado no jornal Tymburibá (1888), e colaborou com dezenas de jornais e revistas, a
maioria fluminenses.
Considerada uma das
primeiras feministas do Brasil (publicou em jornais veementes artigos, como “A
mulher do século XIX”), Narcisa Amália morreu aos 72 anos, em 24 de junho de
1924, em decorrência da diabetes; na época, já se encontrava cega e com
problemas de mobilidade.
* * * * *
PORQUE SOU FORTE
Dirás
que é falso. Não. É certo. Desço
Ao
fundo d’alma toda vez que hesito...
Cada
vez que uma lágrima ou que um grito
Trai-me
a angústia – ao sentir que desfaleço...
E
toda assombro, toda amor, confesso,
O
limiar desse país bendito
Cruzo:
– aguardam-me as festas do infinito!
O
horror da vida, deslumbrada, esqueço!
É
que há dentro vales, céus, alturas,
Que
o olhar do mundo não macula, a terna
Lua,
flores, queridas criaturas,
E
soa em cada moita, em cada gruta,
A
sinfonia da paixão eterna!...
– E eis-me de novo forte para a luta.
* * * * *
RESIGNAÇÃO
No
silêncio das noites perfumosas,
Quando
a vaga chorando beija a praia,
Aos
trêmulos rutilos das estrelas,
Inclino
a triste fronte que desmaia.
E
vejo o perpassar das sombras castas
Dos
delírios da leda mocidade;
Comprimo
o coração despedaçado
Pela
garra cruenta da saudade.
Como
é doce a lembrança desse tempo
Em
que o chão da existência era de flores,
Quando
entoava o múrmur das esferas
A
copla tentadora dos amores!
Eu
voava feliz nos ínvios serros
Empós
das borboletas matizadas...
Era
tão pura a abóbada do elísio
Pendida
sobre as veigas rociadas!...
Hoje
escalda-me os lábios riso insano,
É
febre o brilho ardente de meus olhos:
Minha
voz só retumba em ai plangente,
Só
juncam minha senda agros abrolhos.
Mas
que importa esta dor que me acabrunha,
Que
separa-me dos cânticos ruidosos,
Se
nas asas gentis da poesia
Eleva-me
a outros mundos mais formosos?!...
Do
céu azul, da flor, da névoa errante,
De
fantásticos seres, de perfumes,
Criou-me
regiões cheias de encanto,
Que
a luz doura de suaves lumes!
No
silêncio das noites perfumosas
Quando
a vaga chorando beija a praia,
Ela
ensina-me a orar, tímida e crente,
Aquece-me
a esperança que desmaia.
Oh!
Bendita esta dor que me acabrunha,
Que
separa-me dos cânticos ruidosos,
De
longe vejo as turbas que deliram,
E
perdem-se em desvios tortuosos!...
Comentários
Postar um comentário