MANUELLA
BEZERRA DE MELO nasceu no dia 19 de outubro de 1982, em
Recife (PE). Jornalista e poeta, Pra que roam os cães nessa hecatombe (2020) é seu mais recente livro. É autora de Pés pequenos para tanto corpo (2019), Existem sonhos na rua amarela (2018, com
ilustrações de Java Araújo) e de Desanônima
(2017), e participou da antologia Pedaladas
Poéticas (2017).
Mora em Portugal, onde cursa o mestrado em Teoria da Literatura
e Literatura Lusófonas, a Universidade de Minho.
* *
*
Disseram quando nasci nem
chorei
gritei como hiena e pequena
já a postos com escudo e
armadura
a me proteger de você à
minha frente
cá prostrada de peito pro
alto
esqueci o formato das nuvens
ouço dos pássaros as ultimas
histórias
débeis sobre dribles em
gatos
fui percebida e quase
desviei do coice
do céu faustoso mas não foi
possível hoje
demente segui com as marcas
da pata
celeste na caixa torácica
duas ferraduras
do lado esquerdo do peito
* *
*
Envenenei o céu pra que você
não visse morrer a segunda
filha
o socialismo é um programa
é uma fenda no meu umbigo
é uma pasta de grão de bico
sob uma torrada com azeite
cancelei o café diário
que equivale ao suicídio sem
extremismos
quantos estômagos são
necessários
pra digerir a graxa que você
passou?
quantos fígados precisas
pra filtrar todo álcool
necessário
de seguir viva?
Perguntam-me como estou?
efetivamente viva
por vezes, nem tanto
quase sempre
esta parte, omito
omissão é a caverna
eficiente dos ineficientes
não se compartilha maledicências
dores amargores brotoejas
feridas abertas são
constrangedoras
e já não há mais ninguém em
condições
tenha selfies sorridentes e
esbeltas
braços abertos, rei do mundo
as minorias se adéquam
ou desaparecem
antagonismos a parte
o socialismo é um programa
* *
*
Esse ano morreu
depois nasceu
a terra sente o peso
do ano correr como
corre a água no rio
ao menos não foi
como no anterior
que morreu e lá ficou
morrido; mas mesmo
queria ser laranja de
pomar ou chuchu na
serra que dá aos montes
o ano inteiro
Comentários
Postar um comentário