Italo Diblasi

(Rio de Janeiro, RJ, 22.jun)



Desde o farol que não vi sobre o mar


Quando vemos uma coisa

pela primeira vez é como

se já a tivéssemos visto sempre

e como se nunca pudéssemos

vê-la novamente porque

na verdade não vemos nada


não se trata de uma questão

de cegueira ou ponto de vista

é uma espécie de miragem,

nos dizem, e nós seguimos

enxergando como nunca


uma vez foi uma Santa que

– juram – foi vista chorando

sob madeira e âmbar

fazia calor e a cor dela

era escura


"Enxergamos melhor no escuro"

me disse num dia a mulher que

amparava-me o medo e a febre

quando a vida era medo e febre


não sei por onde anda a mulher

mas nunca mais tive a febre

ainda que medo sim


quando descobri que era míope

aprendi a imaginar


se me fosse dada outra vez,

olhava as coisas com menos

atenção, abandonava os gatos

da mesma maneira e continuaria

amando os cavalos, como

gostamos de amar

as coisas distantes


aquelas que necessitamos construir

contra nós e por eles, com eles,

coisas irremediavelmente perdidas

e excitantes – a infância,

um último banho de mar,

a primeira palavra que

você escreveu


na fotografia o farol distante

que não vi sobre o mar

continua lá


algo que ainda penso em

ver antes de morrer: o Mediterrâneo


lembrar que aquilo ali já foi o mundo


e que hoje esse mundo anda

agigantado,

estrábico.

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog