Luís Gonzaga Pinto da Gama

(Salvador, BA, 21.jun.1830 – São Paulo, SP, 24.ago.1882)


Lá Vai Verso!


Quero também ser poeta,

Bem pouco, ou nada me importa

Se a minha veia é discreta

Se a via que sigo é torta

                                (F. X. de Novais)


Alta noite, sentindo o meu bestunto

Pejado, qual vulcão de flama ardente,

Leve pluma empunhei, incontinente

O fio das ideias fui traçando.


As Ninfas invoquei para que vissem

Do meu estro voraz o ardimento;

E depois, revoando ao firmamento,

Fossem do Vate o nome apregoando.


Oh! Musa da Guiné, cor de azeviche,

Estátua de granito denegrido,

Ante quem o Leão se põe rendido,

Despido do furor de atroz braveza;

Empresta-me o cabaço d'urucungo,

Ensina-me a brandir tua marimba,

Inspira-me a ciência da candimba,

As vias me conduz d'alta grandeza.


Quero a glória abater de antigos vates,

Do tempo dos heróis armipotentes;

Os Homeros, Camões  aurifulgentes,

Decantando os Barões da minha Pátria!

Quero gravar em lúcidas colunas

Obscuro poder da parvoíce,

E a fama levar da vil sandice

Às longínquas regiões da velha Báctria!

 

Quero que o mundo me encarando veja

Um retumbante Orfeu de carapinha,

Que a Lira desprezando, por mesquinha,

Ao som decanta de Marimba augusta;

E, qual Aríon entre os Delfins,

Os ávidos piratas embaindo –

As ferrenhas palhetas vai brandindo,

Com estilo que presa a Líbia adusta.


Com sabença profusa irei cantando

Altos feitos da gente luminosa,

Que a trapaça movendo portentosa

A mente assombra, e pasma à natureza!

Espertos eleitores de encomenda,

Deputados, Ministros, Senadores,

Galfarros Diplomatas – chuchadores,

De quem reza a cartilha da esperteza.


Caducas Tartarugas – desfrutáveis,

Velharrões tabaquentes – sem juízo,

Irrisórias fidalgas – de improviso,

Finórios traficantes – patriotas;

Espertos maganões, de mão ligeira,

Emproados juízes de trapaça,

E outros que de honrados têm fumaça,

Mas que são refinados agiotas.


Nem eu próprio à festança escaparei;

Com foros de Africano fidalgote,

Montado num Barão com ar de zote –

Ao ruflo do tambor, e dos zabumbas,

Ao som de mil aplausos retumbantes,

Entre os netos da Ginga, meus parentes,

Pulando de prazer e de contentes –

Nas danças entrarei d'altas cayumbas.


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