FRANCISCA JÚLIA DA SILVA MÜNSTER nasceu em Xiririca, atual Eldorado, em São Paulo, em 31 de agosto de 1871. Sua carreira literária começou aos 20 anos, ao publica sonetos no jornal O Estado de S. Paulo, e, ente 1892 e 1895, para o Correio Paulistano.
Ao publicar o primeiro livro, em 1895, Mármores, poucos acreditaram que os versos fossem de uma mulher – entre os que duvidavam, os poetas Olavo Bilac e Raimundo Correia. Mas o “engano” foi logo desfeito, e a segunda obra, de 1899, O livro da infância (coletânea de pequenos textos em prosa e verso, que a tornou precursora da literatura infantil no Brasil) foi adotado pelas escolas públicas e particulares de São Paulo.
Em 1903, um novo livro, Esfinges, com reedição em 1920. No começo de 1904, foi proclamada membro efetivo do Comitê Central Brasileiro da Societá Internazionale Elleno-Latina, mas afastou-se da vida pública. Só voltou à literatura em 1912, em coautoria com o irmão, Júlio César da Silva, no livro Alma Infantil, e teve sua obra reunida em Poesias (1962). Ficou conhecida como a “Musa Impassível” (título de um poema seu, do primeiro livro) e, depois de sua morte, foi homenageada com uma escultura em granito carrara, de autoria do modernista Victor Brecheret, desde 2006 na Pinacoteca de São Paulo – mas seu nome é pouco lembrado, sequer estudado.
Sua participação na mídia da época foi intensa, tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro – em O Álbum e em A Semana. Publicou também em A Cigarra, A Vida Moderna, Kosmos, O Pirralho, A Época, Renascença, Revista da Semana, entre outros. Também realizou palestras/conferências com temas espirituais.
Francisca Júlia se suicida em São Paulo (SP), no dia 1º de novembro de 1920, logo após a morte do marido, vitimado pela tuberculose.

* * *


SUPREMO

Os teus olhares feitos de carinho,
De Extrema-Uncção, de mysticos luares,
Têm na expressão, ó santa dos Altares,
A velludosa maciez do arminho.

E no doce brilhar – áureo caminho –
A profundeza intérmina dos mares…
Têm na expressão, ó Santa, os teus olhares
A velludosa maciez do arminho.

São puros como as Hóstias dos Sacrários,
têm o brilho divino de Stellarios,
quando me fitam numa uncção extrema.

São rútilos santelmos guiadores,
são as dhulias lithurgicas das dores,
da minha Crença immácula e suprema!

* * *

MUSA IMPASSÍVEL I

Musa! Um gesto sequer de dor ou de sincero
Luto jamais te afeie o cândido semblante!
Diante de um Jó, conserva o mesmo orgulho, e diante
De um morto, o mesmo olhar e sobrecenho austero.

Em teus olhos não quero a lágrima; não quero
Em tua boca o suave e idílico descante
Celebra ora um fantasma anguiforme de Dante;
Ora o vulto marcial de guerreiro de Homero

Dá-me o hemistíquio d’ouro, a imagem atrativa;
A rima cujo som, de uma harmonia celebra,
Cante aos ouvidos d’alma; a estrofe limpa e viva;

Versos que lembrem, com seus bárbaros ruídos,
Ora o áspero rumor de um calhau que se quebra,
Ora o surdo rumor de mármores partidos.

* * *

VÊNUS

Branca e hercúlea, de pé, num bloco de Carrara,
Que lhe serve de trono, a formosa escultura,
Vênus, túmido o colo, em severa postura,
Com seus olhos de pedra o mundo inteiro encara.

Um sopro, um quê ele vida o gênio lhe insuflara;
E impassível, de pé, mostra em toda a brancura,
Desde as linhas da face ao talhe da cintura,
A majestade real de uma beleza rara.

Vendo-a nessa postura e nesse nobre entono
De Minerva marcial que pelo gládio arranca,
Julgo vê-la descer lentamente do trono,

E, na mesma atitude a que a insolência a obriga,
Postar-se à minha frente, impassível e branca,
Na régia perfeição da formosura antiga.

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