O escritor PAULO BENTANCUR nasceu no dia 20 de agosto de 1957, em Santana do Livramento. Publicou crônicas, contos e voltou-se para a literatura infanto-juvenil, mas tem em seu currículo um livro de poemas Bodas de Osso, de 2005, que recebeu o Prêmio Açorianos.
Foi merecedor de outros três Açorianos: pela organização de Simões Lopes Neto – Obra Completa (2004), O menino escondido (1996) e por Instruções para iludir (1995). Teve contos publicados na Argentina e na Itália, trabalhou em editoras como revisor, preparador de originais, tradutor do espanhol e editor assistente, coordenador do Livro e Literatura da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre e editor da Imprensa Oficial do Rio Grande do Sul, quando editou, junto com o artista gráfico Antonio Henriqson, a revista cultural VOX XXI (2000-2002).
Entre seus livros, A solidão do Diabo (2006, crônicas), Agulha ou linha, quem é a rainha (1992, infanto-juvenil), As rimas de Rita e O olhar das palavras (ambos de 2005, voltados para o público infanto-juvenil). Escreveu para jornais do estado, entre eles a Folha de Hoje, de Caxias do Sul (RS), e ministrou oficinas de criação literária e de leitura crítica.
Faleceu em 28 de agosto de 2016, em Nilópolis (RJ), em decorrência de uma parada cardíaca.

* * *


URBANO

A cidade abre-se em luz,
fecha-se na sombra
reduz meu olhar
se não a ouço.
Mas seu tráfego grita.
Sua gente agitada
imita o tempo sem música
e eu escorro lentamente
na direção desse mar.
Sou um afluente
que a avenida recebe,
incorpora em seu leito
e nas tardes de um sol poeirento
escorro no fluxo do cimento.
Da Zona Norte ao Centro
são trinta quilômetros.
A cidade é grande.
Sou um homem que a leva no bolso
sob a forma de um endereço.

* * *

FILHO DE QUEM

Conduziu-me pela mão
o som de membro tão hábil.

Levou-me na direção,
as minha pernas cantando
pedras, tropeços, recantos.

Sentou-me no colo do chão,
desenhou-me a cor da grama,
coloriu-me a terra densa
e suas raízes músculos.

Ergueu-me o rosto pro céu,
a cegar o sol e as nuvens.

Baixou-me o olhar até
o leito onde escorriam
as palavras a criar
o menino já crescido.

Minha mãe com seu vestido,
puído, escondendo os joelhos;
meu pai tropeçando vinho,
gargalhando com os vizinhos.

Eu já era cuidado
ao ponto de cuidadoso
com o que dizia a todos.

Os livros ali tão perto.
Os livros me sussurrando.
Os livros: conselho, relho,
Os livros, sérios, brincando.

Os livros, pais a me dar
um rumo, martelo, murros
necessários no recreio
quando colegas cravavam
receio em quem pensavam
ser filho de pais ausentes.

Literatura, a bênção,
senhora, minha mãe de sempre.

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