Poeta, ROSSYR
BERNY (Adão Rossir Berny de Oliveira) nasceu em 30 de agosto de 1952, em
São Gabriel (RS). Mestre em Teoria da Literatura, é também editor, jornalista,
professor e tradutor. Publicou Homem-Autômato,
em 1978, e depois seguiram-se mais de 20 livros, entre poesia e prosa.
Seus poemas estão em antologias pessoais, de 1997 (Percursos do feroz cotidiano), 2006 (Construtores de precipícios, traduzida
para o francês e o espanhol), 2014 (Volta
ao mundo em 500 poemas) e 2017 (101
poemas escolhidos, organizada pela professora Jane Tutikian).– entre outras
–, e na Coletânea de poesia gaúcha
contemporânea (2013), organizada por Dilan Camargo, e podem ser ouvidas no
CD Armas Amores, de 2001.
Em 2000 publicou o único romance histórico, Entreguem o matador à família do morto –
Brasil 500 Danos. Como tradutor, verteu para o português obras dos poetas
uruguaios Carlos Higgie, Nélida Marina e Rubinstein Moreira.
Em 1985 fundou a Editora Alcance, que tem recebido, ao
longo dos anos, diversos prêmios, como o Jabuti (2008), o Raíces (Argentina) e
o Carlos Sabat Ercasty (Uruguai). É integrante da Associação Gaúcha dos
Escritores (AGES), da Casa do Poeta Riograndense e da Associação Riograndense
de Imprensa (ARI).
* * *
ACONTECIMENTO
URBANÍSSIMO
Como tem chorado
o homem
que mora aqui ao lado
Acordo às madrugadas
com seu surdo soluço
Rio turvo em rosto turvo
Desde que conheço o inocente
não há vértebras ou músculos
seus
que não chorem de corpo
inteiro
Tão imensa e tão mínima
é a pátria do peito
que só deseja voltar para
casa
Aqui sobrevivo enlouquecido
menino
que sonha apenas salvar o
mundo
É preciso
não voltar ainda para casa
Mas como fazem falta minhas
asas
* *
*
ORIGAMI QUASE
PERFEITO
Nascemos enorme folha em
branco
A vida ensina pelas sendas dos
dias
que se pode dividi-la em mil
outras páginas
Fortunas bancárias
Conquistas siderais
Morar em Gizé Havana Paris
Pasárgada
Preferi deixar a minha em
único papiro
Do tamanho do Vale do Rio Nilo
Com um milhão de dobraduras
e mãos hábeis de amor
construí nós dois em um só
origami
Enriqueci com tintas do
arco-íris
e ternura de comover-te ao
choro de felicidade
Nos fiz barco para irmos aos
mares
Nos fiz viagem para irmos a
Jerusalém
Céus para morarmos no paraíso
Tempo para sermos eternos
Nos fiz peça única para sermos
santuário
e orarmos um frente ao outro
Na pressa inocente de
agradar-te
esqueci de perguntar
se era esse o origami que tu
sonhavas
Se
era esse, se era esse. Não era esse
* *
*
OS
POBRES PAÍSES DA AMÉRICA DO SUL
Quem não divide a luta
não divide o alimento
Em Buenos Aires
há sempre pilhas de pombos
compartindo uma foto na Casa
Rosada
Partilham as sobras sob
mesas
Pelas avenidas e viadutos
Igualmente pessoas partilham
Somos os pobres do mundo
Latinos
latindo
lutando
Quem divide a fome
multiplica o alimento
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