LILA
RIPOLL, nascida em 12 de agosto de 1905, em
Quaraí (RS), mudou-se para Porto Alegre para estudar no Conservatório de Música
(Instituto de Artes da UFRGS), onde formou-se como pianista.
Como poeta, fez parte da
Geração de 30, ao lado de Carlos Reverbel, Cyro Martins e Dyonélio Machado,
entre outros. Publicou De mãos postas
em 1938 e, com o segundo livro, Céu Vazio:
poesias (1941), obteve o Prêmio Olavo Bilac da Academia Brasileira de
Letras (ABL). Seis anos depois, é a vez de Por
quê?, já no Rio de Janeiro, e, em 1951, Novos
Poemas, que lhe valeu o prêmio Pablo Neruda da Paz (em Praga, na então
Tchecoslováquia) – era uma escritora engajada em campanhas pacificistas.
Em 1954, publica Primeiro de Maio, longo poema sobre o
massacre do dia do trabalhador em Rio Grande, seguido por Poemas e Canções (1957). Filiada ao Partido Comunista desde 1945, depois
do assassinato do primo e irmão adotivo, o advogado e jornalista Waldema Ripoll
(1906-1934), colaborava com o jornal A
Tribuna em 1955; escreveu, também, para a Revista Horizonte (Porto Alegre), ao lado de Pablo Neruda e
Gabriela Mistral – revista para a qual traduziu Um poeta, de Nazim Hikmet, e Balada
para o que cantou no suicídio, de Louis Aragon (na edição de
novembro/dezembro de 1951) e na qual publicou o poema in memoriam “Angelina”, dedicado à tecelã Angelina Gonçalves,
assassinada durante passeata de operários em Rio Grande, no dia 1º de maio de
1950 (edição nº 27, de 1954).
Em 1958, incursionou pela
dramaturgia com Um colar de vidro,
mas, em 1961, com apoio de um grupo de intelectuais cariocas, voltou à poesia,
com O coração descoberto, e, em 1965,
Águas Móveis, o último livro com
poemas inéditos. Seus poemas foram reunidos em Obra Completa, organizada por Alice T. Campos Moreira e editada
pelo Instituto Estadual do Livro (IEL) em 1998. Um ano antes, a
professora-pesquisadora Maria da Glória Bordini havia organizado Ilha Difícil: antologia poética, com uma
seleção de poemas de Lila. Em 1967 e 1968, respectivamente, foram publicados Antologia Poética (organizada por Walmyr
Ayala) e Poesias (organizado por
Sergio Faraco).
Chegou a ser presa em 1964,
logo após o Golpe Militar, mas foi libertada em função de seu estado de saúde.
Faleceu em Porto Alegre, em 7 de fevereiro de 1967, vitimada por um câncer. Lila é patrona
da cadeira nº 26 da Academia Literária Feminina do Rio Grande do Sul e também
da sala de eventos no IEL. Em 2005 foi criado o Prêmio Lila Ripoll de Poesia,
promovido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.
* * *
GRITO
Não, não irei sem grito.
Minha voz nesse dia subirá.
E eu me erguerei também.
Solitária. Definida.
As portas adormecidas abrirão
passagem para o mundo
Meus sonhos, meus fantasmas,
meus exércitos derrotados,
sacudirão o silêncio de convenção
e as máscaras de piedade compungida.
Dispensarei as rosas, as violetas,
os absurdos véus sobre meu rosto.
Serei eu mesma. Estarei
inteira sobre a mesa.
As mãos vazias e crispadas,
os olhos acordados,
a boca vincada de amargor.
Não. Não irei sem grito.
Abram as portas adormecidas,
levantem as cortinas,
abaixem as vozes
e as máscaras –
que eu vou sair inteira.
Eu mesma. Solitária.
Definida.
* * *
FESTEJO
Foi num primeiro de maio,
na cidade de Rio Grande.
O céu estava sem nuvens.
O mês das flores nascia.
O vento lembrava as flores
no perfume que trazia.
O povo reuniu-se em festa
pois a festa era do povo.
Crianças, homens, mulheres,
o povo unido cantava.
O povo simples da rua,
comovido se abraçava.
O mês das flores nascia
e o vento lembrava das flores
no perfume que trazia.
Foi num primeiro de maio,
de pensamento profundo.
“Uni-vos, ó proletários,
ó povos de todo o mundo”.
Unido estava em Rio Grande,
o povo simples cantando.
No peito de cada homem
uma esperança se abria.
Em qualquer parte do mundo
uma estrela respondia.
Era primeiro de maio
dia da festa do mundo.
O velho parque esquecido
tinha um ar claro e risonho.
Germinava no seu peito
o calor de um novo sonho.
Misturavam-se cantigas,
frases, risos, alegrias.
No peito de cada homem,
um clarão aparecia.
Surgiam jogos e prendas,
hinos subiam ao ar.
Em cada grupo uma história
alguém queria contar.
A tecelã Angelina,
vivaz e alegre cantava.
Recchia – o líder operário
ria e confraternizava.
Era primeiro de maio,
dia de festa do mundo.
Foi quando a voz calma e séria,
no velho parque vibrou,
e um convite alvissareiro
o povo unido escutou:
“Amigos, a rua é larga.
Unidos vamos partir.
A nossa ‘União Operária’
nós hoje vamos abrir.”
No peito de cada homem
um clarão aparecia.
Em qualquer parte do mundo,
uma estrela respondia.
“A casa de nossa classe,
Fechada por que razão?
Amigos, vamos à rua,
e as portas se abrirão.”
A onda humana agitou-se,
cresceu em intensidade.
Em coro as vozes subiram
clamando por liberdade.
“À rua, à rua, sem medo,
unidos, vamos marchar.”
Foi se uma rajada
de vendo encrespasse o mar.
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